No início do mandato, o presidente evitava citar nominalmente seu adversário político, mas desde outubro de 2024 tem feito críticas públicas
No início de seu 3º mandato à frente do Executivo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) evitava citar seu adversário político Jair Bolsonaro (PL) e costumava chamá-lo pela expressão “o outro”. Ao longo de 2025, no entanto, o petista mudou a estratégia. De janeiro a abril deste ano, o presidente citou o ex-chefe do Executivo, seus aliados ou a gestão passada ao menos 60 vezes, mais do que o dobro de todas as citações de 2024.
Em suas falas, Lula costuma comentar sobre a disseminação de notícias falsas e uma possível negação à ciência por parte de Bolsonaro. O levantamento do Poder360 considerou as íntegras dos discursos e entrevistas do presidente divulgadas no site oficial do Planalto. O período de análise foi de 1º de janeiro de 2023 a 23 de abril de 2025.
Caso o ritmo de menções ao ex-presidente se mantenha no padrão de 2025, superará as 100 referências de 2024 e as 80 de 2023, ao final do ano.
Principais menções a Bolsonaro
Dentre as 60 citações do presidente a Bolsonaro e seus aliados em 2025, as principais temáticas abordadas foram:
- período pandêmico de covid-19 — principalmente ao mencionar tratamentos alternativos propostos por Bolsonaro e atuações relacionadas à vacinação. Frequentemente o culpa por uma grande parcela das mortes na pandemia;
- relação entre político e eleitor — já chegou a mencionar que o ex-presidente era um “aloprado” que “só gosta de pobre na época de eleição”;
- referência — negligências, mentiras, promessas não cumpridas e obras paralisadas;
- tentativa de golpe de Estado e de assassinato — a Lula, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes.
LULA X BOLSONARO
Apesar da inelegibilidade de Bolsonaro até 2030, que o tiraria do pleito realizado em 2026, o chefe do Executivo vê como ameaçadora a influência do capitão da reserva no cenário político atual. Eles estariam em empate técnico se as eleições fossem hoje, com 45,1% para Bolsonaro e 44,2% para Lula, segundo a última pesquisa da AtlasIntel.
A percepção da população sobre o 3º mandato de Lula também contribui para a apreensão do governo. Segundo o mesmo instituto, apesar de uma breve melhora em comparação com pesquisas anteriores, os que desaprovam o governo são 50,1%. Em março, a aprovação era de 37,4%.
O efeito dos resultados de programas que, outrora foram importantes para a popularidade de Lula, como o Minha Casa, Minha Vida e o Bolsa Família, já não engajam mais a base eleitoral fixa do presidente. A isenção do IR (Imposto de Renda) para quem ganha até R$ 5.000 está entre as tentativas do governo federal para atrair o maior público votante brasileiro.
LULA X POVO
A proximidade com o eleitor sempre foi uma característica do petista. Os eventos públicos com a presença de aliados são maioria em comparação com outros tipos de agendas, como entrevistas coletivas a jornalistas.
Desde a 1ª entrevista coletiva realizada sob a tutela do novo ministro da Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência), Sidônio Palmeira, em 30 de janeiro, Lula só repetiu o feito em uma oportunidade, quando deixou o Vietnã após acordos de avanços comerciais na Ásia.
As falas com jornalistas geralmente são breves e de última hora, como no embarque depois do enterro do papa Francisco. A promessa é de que o Planalto seria mais “vocal” e próximo da imprensa.
FATOR SIDÔNIO
A influência do ministro da Secom é visível no modo de comunicação do presidente. No início da gestão, no final de janeiro, Sidônio Palmeira indicou que Lula avançasse mais contra Bolsonaro e explorasse a alta rejeição ao ex-presidente, todavia, as citações e indiretas foram se convertendo em um discurso mais centrado do petista. A recomendação de que Lula declamasse diretamente as falas escritas e mitigasse o perigo de novas gafes por impulso surtiu efeito.
Como mostrou o Poder360 em fevereiro, a estratégia de comunicação se relaciona mais com o público jovem nas redes sociais e promove mais as “jóias da coroa” do governo: os programas sociais.
NEM TUDO É BRIGA
Apesar das frequentes menções negativas a Bolsonaro e aliados, Lula faz movimentos de aproximação a figuras de oposição. Foi o caso das cidades de Sorocaba (SP) e Campos dos Goytacazes (RJ), que possuem administradores que apoiam o ex-presidente, o que não impediu o diálogo e cooperação do chefe do Executivo em eventos recentes. Lula atribui a relação a “deixar as divergências políticas de lado” e exercer os devidos papéis nas atividades institucionais.
O presidente também evita em seus discursos mencionar o período eleitoral que se aproxima. Não confirma uma pré-candidatura à reeleição e não indica um possível sucessor, além de não comentar os desdobramentos da oposição para encontrar um candidato que substitua Bolsonaro e enfrente Lula com chances em 2026.
Este texto foi produzido pelo estagiário de jornalismo Davi Alencar sob a supervisão do editor Augusto Leite.