Congresso em Foco

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Muito antes de os internautas brasileiros cunharem o meme do “Bolsomito” para se referir a Bolsonaro em 2018, espalharem fotos de Aécio Neves na campanha presidencial de 2014 usando óculos escuros pixelados ao som de “Turn Down for What”, a “turma boa” de Ciro Gomes adotar rosas em seus nomes em perfis virtuais, ou o presidente Lula viralizar em 2022 prometendo “cerveja e picanha”, Fernando Collor abriu a história das eleições diretas da Nova República com seu próprio meme: autointitulando-se o “Caçador de Marajás”.

A expressão atribuída ao ex-presidente reflete um espírito constante nas eleições brasileiras: em 1986, durante sua campanha ao governo de Alagoas, Collor juntou-se ao coro de candidatos que surgem com a proposta de enfrentar os super salários e os alegados privilégios do funcionalismo público. O termo “marajá” originalmente se refere a líderes feudais da sociedade indiana, sendo utilizado por Collor para se referir aos servidores públicos mais privilegiados, principalmente aqueles em cargos comissionados.

Com o apelido de

Com o apelido de “Caçador de Marajás”, Collor moldou imagem de inimigo da corrupção em campanha presidencial.Hemeroteca Digital Brasileira/Reprodução

Origem do apelido

O apelido colou na imprensa: entre 1988 e 1989, o Correio Braziliense, de tiragem diária, referiu-se a Collor 60 vezes como “caçador de marajás”. No Jornal do Brasil, foram 55 vezes, enquanto o Diário de Pernambuco liderou com 67 citações. Já na revista Veja, Collor apareceu na capa em 1988 com o título: “Collor de Mello: o Caçador de Marajás”.

Collor, porém, não foi o primeiro a chamar a elite do funcionalismo público de “marajá”. O termo já era ocasionalmente usado em jornais para denunciar funcionários com salários exagerados. Durante sua campanha para governador em 1986, um eleitor sugeriu que ele combatesse esses privilégios. Collor transformou a ideia em lema eleitoral.

Uma vez eleito, ganhou popularidade ao cortar os salários de 273 servidores do estado, considerados abusivos. “Há uma casta de funcionários, os marajás, que sempre desafiaram qualquer lei e qualquer poder. Vou combatê-los até o fim”, declarou em entrevista à Veja. A decisão lhe trouxe problemas na Justiça, mas ampliou sua fama nacionalmente, levando outros governadores a adotarem medidas semelhantes.

Apelido presidencial

A fama de “caçador de marajás” sustentou-se até a eleição presidencial de 1989, quando Collor, governador mais popular do Nordeste, apresentou-se com a mesma linha de propaganda. Sua candidatura conquistou adeptos em todas as regiões do país.

Sua reputação, no entanto, enfrentou críticas. Durante a campanha, Roberto Freire, candidato pelo PCB, acusou Collor de hipocrisia: “O governador de Alagoas se contradiz, porque ele mesmo, na prefeitura de Maceió [1979-1982], foi um dos que mais nomearam sem concurso, inchando a máquina administrativa”, declarou ao Diário de Pernambuco.

Apesar das críticas, Collor manteve sua imagem de “caçador de marajás” e defensor da moralidade, temas centrais em sua campanha. Em 17 de dezembro de 1989, foi eleito presidente no segundo turno com 35 milhões de votos, equivalentes a 53,03% do total.

Fim do caçador

A fama de moralizador durou pouco. Em 1992, um vasto esquema de corrupção envolvendo seu tesoureiro de campanha, Paulo César Farias (PC Farias), veio à tona após denúncias feitas por seu próprio irmão, Pedro Collor. As investigações revelaram tráfico de influência no Congresso, desvio de recursos públicos e o financiamento de despesas pessoais do presidente com dinheiro ilícito, culminando na instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).

As denúncias avançaram e sepultaram sua reputação de “caçador de marajás”: ao longo do ano, protestos em defesa de seu impeachment ganharam força, impulsionados pelo movimento dos Caras-Pintadas. Em setembro, o Congresso Nacional deu início ao processo de impeachment. Collor renunciou, mas o julgamento prosseguiu.

O ex-presidente ficou inelegível por oito anos, e sua reputação nunca mais foi a mesma. Antes o governador mais popular do Nordeste, Collor tentou retornar ao Palácio Floriano Peixoto em 2002 e 2022, sem sucesso. Ainda assim, manteve alguma relevância política, sendo eleito senador por Alagoas em 2006 e 2014.

Sua carreira política pode ter chegado ao fim na última sexta-feira (25), com sua condenação no Supremo Tribunal Federal (STF) por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele foi sentenciado a oito anos e dez meses de prisão no âmbito da Operação Lava Jato, acusado de participação em um esquema de propinas na BR Distribuidora durante seu mandato no Senado.



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