Martin Baron, que foi editor-executivo do “Post”, critica a forma como o dono da Amazon tem conduzido a política editorial da publicação
O ex-editor-executivo do Washington Post Martin Baron afirmou que Jeff Bezos danificou a imagem do jornal depois de comprá-lo. Em um artigo publicado na revista The Atlantic (para assinantes) na 2ª feira (3.mar.2025), o jornalista norte-americano critica a forma como o dono da Amazon tem conduzido a política editorial da publicação.
No texto, Baron afirma que Bezos prometeu defender a independência jornalística do jornal quando o adquiriu em 2013 e fez um bom trabalho por mais de uma década. Mas, nos últimos meses, tem falhado ao enfrentar o retorno de Donald Trump (Republicano) à Casa Branca.
“Tem sido irritante observar o dano que ele causou nos últimos meses à reputação de um jornal cuja reportagem investigativa tem servido como uma barreira contra os impulsos mais transgressores de Trump. Todos os sinais recentemente apontam para um esforço determinado de Bezos para apaziguar ou agradar Trump”, escreveu o jornalista.
Baron listou as seguintes atitudes de Bezos:
- a decisão de não endossar Kamala Harris (Democrata) para a presidência, rompendo uma tradição do Post;
- um elogio público a Trump por seu “extraordinário retorno político” depois de vencer as eleições;
- um jantar com Trump e Melania, que resultou em um acordo lucrativo para a produção de um documentário sobre a primeira-dama;
- a presença de Bezos na posse de Trump;
- uma diretriz proibindo artigos de opinião que não estejam alinhados com sua visão de “liberdades individuais e livre mercado”, o que levou à renúncia do editor da seção de opinião David Shipley.
“Centenas de milhares de leitores cancelaram suas assinaturas, não confiando mais que este grande jornal manterá a fé na missão implícita em seu lema ‘A democracia morre na escuridão’. Muitos dos talentosos jornalistas do ‘Post’ partiram para outros meios de comunicação, incertos sobre a estratégia e a alma de seu jornal”, disse.
Baron sugere que a mudança nas atitudes de Bezos pode estar relacionada a seus interesses comerciais. O bilionário, portanto, quer evitar represálias que poderiam prejudicar os negócios de suas empresas, como a Amazon e a Blue Origin.
“A grande questão é o porque a linguagem e o comportamento de Bezos mudaram de forma tão dramática. Claro, não posso entrar na cabeça dele, mas uma resposta deve estar em um fato indiscutível: Trump está menos calmo, menos equilibrado e muito mais vingativo. Ele fez campanha prometendo retribuição contra ‘o inimigo interno’ –em outras palavras, qualquer um que se opusesse a ele”, afirmou.
Baron conclui o texto afirmando que Bezos deveria se lembrar dos princípios fundamentais do Washington Post, que incluem a busca pela verdade e a obrigação do jornal de servir aos leitores, não aos interesses privados de seus proprietários.
QUEM É MARTIN BARON
O jornalista, 70 anos, aposentou-se como editor-executivo do Washington Post em 2021. Também é autor do livro Collision of Power: Trump, Bezos, and The Washington Post (“Colisão de Poder: Trump, Bezos e o Washington Post”, na tradução livre). Ele atuou ainda como editor do Boston Globe e do Miami Herald.
No Globe, liderou a equipe investigativa Spotlight na cobertura do escândalo de abusos sexuais na Igreja Católica, o que resultou no Prêmio Pulitzer de serviço público em 2003. A atuação de Baron e de sua equipe no caso foi retratada no filme “Spotlight”, que ganhou o Oscar de melhor filme em 2016.