A democracia está em crise? Qual o papel da desinformação? Há hoje abundante literatura e espaço central para o debate sobre a manipulação da verdade como ferramenta de ação política através das tão propaladas fake news.
Mas este é um problema novo? De jeito algum. A fofoca, as notícias falsas, as mentiras são presentes na vida pública e privada desde que o mundo é mundo, desde a Grécia Antiga e o Império Romano. E foram eficazes em grandes momentos da História.
Não sem motivos o escritor americano Mark Twain registrou: “Uma mentira pode dar a volta ao mundo enquanto a verdade ainda calça os sapatos”. A instrumentalização da mentira foi legitimada por Gobbels, ministro da propaganda da Alemanha nazista: “Uma mentira dita mil vezes torna-se verdade”. Existe um ditado jornalístico: “A primeira vítima da guerra é a verdade”. Hitler usou intensamente a mentira como arma. Lendo as Memórias da Segunda Guerra Mundial, de Winston Churchill, vencedor do Nobel de Literatura, fica claro como a França e a Inglaterra, pela tibieza de seus governos nos anos de 1930, foram imobilizados por sucessivas mentiras de Hitler, que prometeu, em diferentes momentos, não invadir a Tchecoslováquia, a Polônia, a União Soviética e a França, e invadiu todos esses países.
Stalin simplesmente mandava tirar das fotos históricas as figuras de Trotsky, Kamenev, Zinoviev, Bukarin, considerados dissidentes e “inimigos do socialismo”. Uma das maiores coleções de mentiras, fake news se preferirem, foram os famosos “Processos de Moscou” que, de 1936 a 1938, resultaram na execução de toda a velha guarda bolchevique.
Toda a polêmica em torno da suposta tributação das operações via PIX e o grau de controle da Receita Federal sobre a vida dos contribuintes reacendeu o debate no Brasil. Mas, nestas terras tropicais, o assunto também não é novo. Fui testemunha ocular como um dos coordenadores das campanhas citadas a seguir.
Em 2004, Juiz de Fora, eleições para prefeito, na passagem do primeiro para o segundo turno, espalhou-se na cidade uma brutal mentira. Nosso candidato era deputado federal. Foi disseminada, em larga escala, a “notícia” de que ele teria votado para acabar com direitos dos trabalhadores tais como férias, décimo terceiro, FGTS etc. Ferramentas usadas: e-mails, panfletos apócrifos, e, pasmem, teatro invisível – sem a autorização de Augusto Boal – nos ônibus da cidade. Resultado da eficaz mentira e de nossa reação tardia: nosso candidato perdeu 10% e a liderança, e dias depois, o segundo turno.
Eleição presidencial de 2014. Eu era tipo um ouvidor político da coordenação de comunicação. Sexta-feira, a nove dias do segundo turno, me liga um prefeito da Baixada Fluminense: “Deputado, estou nas ruas pedindo voto para nosso candidato e é a terceira senhora em bairros diferentes que me conta a mesma história: recebeu um telefonema da Caixa para se recadastrar rapidamente no Minha Casa, Minha Vida, porque se o nosso candidato vencer vai acabar com o programa”. Durante todo o dia choveram telefonemas do Brasil inteiro com a mesma “estória”! Ferramenta de disseminação da fake news: call center.
Como se vê a fake news como ferramenta política só ganhou escala e velocidade com as redes sociais e os aplicativos de mensagem. A difícil questão é: como combater a mentira sem agredir a liberdade de expressão?
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