O depoimento do ex-presidente Jair Bolsonaro nesta terça, 10/6, como réu em um processo que pode condená-lo a muitos anos de cadeia, deixou a sensação que o bolsonarismo arregou. Em horas de depoimento transmitidas ao vivo pela TV Justiça, Bolsonaro chamou apoiadores de “malucos”, disse que Lula tem “coração muito grande” e pediu “desculpas” ao Supremo Tribunal Federal. Toda a valentia contra as instituições? Era “retórica”.
A impressão é que ele se queimou com alguns segmentos que até então o acompanhavam, confiantes na sua liderança. Os bolsonaristas mais aguerridos, mais violentos, estão em silêncio. Bolsonaro decepcionou as expectativas depositadas, se apequenou no desespero para salvar a própria pele, diante de um juiz tranquilo e das fartas provas oriundas da investigação da Polícia Federal, que levaram a Procuradoria-Geral da República a apontá-lo como “líder da quadrilha”.
O contraste – que virou meme nas redes sociais – entre ele, vociferando contra Alexandre Moraes na Av. Paulista e a figura do mentiroso covarde, pedindo desculpas e procurando agradar a um juiz firme e destemido, pode ter sido fatal. Para essa gente que cultiva uma postura machista, agressiva, não sobrou nada para reforçar a imagem de um comandante valente que cuida dos seus comandados e dos ideais do grupo. Sobrou até para o advogado de defesa: “foi ele quem imprimiu [o discurso incendiário]”, apontou Bolsonaro, como um colegial medroso, pego no flagra.
Na frente do juiz, Bolsonaro entrega discurso, advogado e militância para tentar escapar da prisão.Fellipe Sampaio/STF
Para os ferozes apoiadores, que arrancaram cruzes fincadas nas areias de Copacabana em um ato pacífico em memória aos mortos pela Covid-19 ou quebraram placas com o nome de Marielle, Bolsonaro arregou. Mostrou-se submisso e preocupado exclusivamente em salvar a própria pele. Nessa busca, não vacilou em chamar seus adeptos de “malucos”.
O silêncio ecoava na Praça dos Três Poderes. Chamou a atenção o fato de não ter ninguém do lado de fora como apoio. Certamente, Bolsonaro ainda tem muitos seguidores. Além de oportunistas que procuram a melhor hora de abandonar o navio com algum pedaço do butim, há os ingênuos ou gente com distúrbios afetivos e cognitivos. Esses, órfãos do modelo de líder valentão, machista e autoritário, parecem caídos, ainda que momentaneamente, numa melancólica apatia.
O “imbrochável” brochou. Foi ferido de morte e não mais se levantará. Ingênuos ou fanáticos não são bons para organizar o rebanho. Restam as velhas e novas raposas, à espreita do butim do bolsonarismo. É preciso superar essa experiência distópica e voltar a discutir temas de interesse da população e do país que desejamos construir. É preciso defender a nossa frágil democracia da voracidade do mercado e trilhar um caminho onde o bem estar da população, a saúde, a justiça social e a responsabilidade ambiental sejam o centro da dinâmica econômica do país.
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