1ª Turma conclui análises das denúncias; entenda os próximos passos do julgamento contra militares
A 1ª Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) tornou nesta 3ª feira (20.mai.2025) mais 9 militares e 1 policial federal réus por envolvimento na tentativa de golpe de Estado de 2022. Foi o último e mais numeroso núcleo a ter a denúncia recebida por unanimidade. Ao todo, as ações penais incluem 31 réus. O colegiado votou para rejeitar a denúncia contra 2 militares.
Segundo a acusação, o núcleo de ações de campo era formado por 11 militares da ativa e da reserva do Exército e 1 agente da corporação. Eles seriam responsáveis por monitorar autoridades, colocar em prática ações para “neutralizá-las” e pressionar o alto comando das Forças Armadas a aderir à tentativa de golpe.
Com isso, uma ação penal é iniciada na Corte e eles passam a responder pelos crimes de abolição violenta do Estado democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, organização criminosa, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Leia quem se tornou réu:
- Bernardo Romão Corrêa Netto, coronel do Exército;
- Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, general da reserva do Exército;
- Fabrício Moreira de Bastos, tenente-coronel do Exército;
- Hélio Ferreira Lima, tenente-coronel do Exército;
- Márcio Nunes de Resende Júnior, coronel do Exército;
- Rafael Martins de Oliveira, tenente-coronel do Exército;
- Rodrigo Bezerra de Azevedo, tenente-coronel do Exército;
- Ronald Ferreira de Araújo Júnior, tenente-coronel do Exército;
- Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros, tenente-coronel do Exército;
- Wladimir Matos Soares, agente da PF.
O coronel da reserva Cleverson Magalhães e o general do Exército Nilton Diniz tiveram a denúncia rejeitada. Os ministros entenderam que não havia indícios fortes o suficiente para afirmar que os militares haviam participado da organização criminosa que, segundo a PGR, teria tentado dar um golpe de Estado.
Os ministros também votaram para rejeitar as alegações preliminares das defesas, como a suspeição dos ministros Roberto Barroso, Dias Toffoli e Edson Fachin e a hipótese sobre haver irregularidades na condução dos depoimentos pela PF.
A partir da publicação do acórdão, com a íntegra dos votos dos 5 ministros da Corte, as defesas têm 5 dias para apresentar recursos. Leia nesta reportagem o papel de cada acusado na tentativa de golpe, segundo a denúncia da PGR.
Leia quem mais é réu por tentativa de golpe:
- Jair Bolsonaro (PL), ex-presidente da República;
- Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e deputado federal;
- Almir Garnier; ex-comandante da Marinha;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
- Augusto Heleno, ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional);
- Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
- Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
- Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e candidato a vice-presidente em 2022;
- Fernando de Sousa Oliveira, delegado da PF;
- Filipe Garcia Martins Pereira, ex-assessor para Assuntos Internacionais de Bolsonaro;
- Marcelo Costa Câmara, coronel da reserva do Exército e ex-assessor da Presidência da República;
- Marília Ferreira Alencar, delegada da PF;
- Mário Fernandes, general da reserva do Exército;
- Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da PRF (Polícia Rodoviária Federal);
- Ailton Gonçalves Moraes Barros, ex-major da reserva do Exército;
- Ângelo Martins Denicoli, major da reserva do Exército;
- Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, presidente do Instituto Voto Legal;
- Giancarlos Gomes Rodrigues, subtenente do Exército;
- Guilherme Marques de Almeida, tenente-coronel do Exército;
- Marcelo Araújo Bormevet, agente da PF; e
- Reginaldo Vieira de Abreu, coronel do Exército.
ENTENDA
O recebimento da denúncia significa que o colegiado entendeu que há indícios de crime e materialidade fortes o suficiente para iniciar uma ação penal contra os denunciados. Uma eventual condenação será definida depois da fase de instrução criminal, com o depoimento de testemunhas, apresentação das teses das defesas e produção de provas.
A oitiva do núcleo crucial começou na 2ª feira (19.mai). Os depoimentos seguirão até 2 de junho, com possibilidade de se estenderem. O mesmo será feito, na sequência, com as testemunhas indicadas pelos réus dos demais núcleos.
Leia os próximos passos para o julgamento:
- interrogatório: a partir da abertura da ação penal, o relator, Alexandre de Moraes, designará datas de interrogatórios. Os réus serão citados (informados formalmente) sobre a data do interrogatório e poderão se defender, podendo ser acompanhados de seus advogados.
- defesa prévia: depois do interrogatório ou intimação do defensor, cada um terá 5 dias para apresentar sua defesa prévia. Caso o advogado apresente novos documentos ou provas, a outra parte (acusação) será intimada a se manifestar no prazo de 5 dias.
- instrução processual: durante a fase de instrução, as provas serão produzidas. Isso inclui o depoimento de testemunhas e a coleta de outros elementos probatórios. O relator pode solicitar novas diligências ou provas, ou pode até mesmo delegar a um juiz inferior a realização de alguns atos, como o interrogatório ou depoimentos, caso isso envolva competência de outra localidade.
- alegações finais: após a instrução (ou coleta de provas), tanto a acusação quanto a defesa terão um prazo de 15 dias para apresentar suas alegações finais por escrito. Caso haja novas provas ou documentos apresentados na fase das alegações finais, as partes serão intimadas para se manifestar sobre eles no prazo de 5 dias.
- julgamento: o colegiado (1ª Turma) irá então julgar o caso com base nas provas e nas alegações finais apresentadas pela acusação e pela defesa. Durante o julgamento, é possível que haja sustentação oral, em que as partes (acusação e defesa) podem se manifestar diante dos juízes. A acusação tem 15 minutos para falar, e a defesa também terá seu tempo. Após os debates, o tribunal deliberará sobre a culpabilidade ou não dos réus.
- decisão: depois do julgamento, a 1ª Turma poderá decidir pela culpabilidade ou inocência dos envolvidos. Se forem condenados, a sentença determinará a pena.
- recurso: caso haja condenação, cada réu pode recorrer da decisão, a partir de embargos de declaração (recurso que pede esclarecimentos sobre a sentença). Se a defesa não recorrer ou se os recursos forem rejeitados, a decisão se torna final e a pena definida deve ser executada.
CONDIÇÕES PARA MILITARES
Os desdobramentos para militares réus em ações penais por tentativa de golpe podem culminar, ao final, na exclusão definitiva das Forças Armadas, com perda de direitos, prerrogativas e status militar.
Ao se tornarem réus, os integrantes das Forças já enfrentam consequências imediatas, tanto no campo jurídico quanto institucional.
Podem ser afastados de suas funções, impedidos de portar arma, de acessar instalações militares ou de exercer comando, além de ficarem sujeitos a medidas cautelares diversas da prisão, como o recolhimento domiciliar noturno ou a proibição de contato com outros investigados.
Segundo o advogado Berlinque Cantelmo, especialista em direito militar e segurança pública, “ainda que essas sanções não impliquem de imediato em sua exclusão das Forças Armadas, refletem diretamente sobre sua atuação profissional e posição na hierarquia militar”.
Cantelmo afirma que, se os réus forem condenados por delitos que tiverem penas maiores do que 2 anos por crimes comuns, ou seja, desvinculados da função militar, podem ser excluídos das Forças Armadas, segundo o Estatuto dos Militares. Até lá, no entanto, o alto comando pode colocar os militares na inatividade ou até mesmo desligá-los.
“No caso de oficiais, a perda do posto e da patente depende de decisão específica a ser tomada pelo presidente da República após processo de natureza político-administrativa, que tramita perante o [STM] Superior Tribunal Militar”, diz Cantelmo.
A competência para julgar crimes comuns praticados por militares é da Justiça comum, no caso, o STF. No entanto, se, no decorrer das investigações surgirem elementos que indiquem a prática de crimes militares conexos (incitamento à desobediência, motim, desrespeito à hierarquia, uso indevido de instalações ou materiais das Forças Armadas), o Ministério Público Militar poderá oferecer nova denúncia na Justiça Militar, com possibilidade de julgamento pelo STM.