A Câmara dos Deputados vai retomar os debates sobre o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com foco em apurar o uso da renúncia fiscal bilionária prevista na lei que criou o programa. A proposta, apresentada na Comissão de Defesa do Consumidor e relatada pelo deputado Felipe Carreras (PSB-PE), prevê uma ampla auditoria com o apoio técnico do Tribunal de Contas da União (TCU) para analisar se os recursos públicos foram aplicados de forma justa, eficaz e transparente.
Investigação será conduzida pelo deputado Felipe Carreras.Zeca Ribeiro/Agência Câmara
A proposta de fiscalização e controle (PFC 9/2025), de autoria do deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA), tem como objetivo investigar detalhadamente os valores envolvidos na renúncia tributária decorrente do artigo 4º da Lei nº 14.148/2021 norma que criou o Perse em meio à pandemia da covid-19 para socorrer os setores de eventos e turismo, entre os mais afetados pela crise sanitária. O instrumento é conhecido como uma mini-CPI, dadas as suas prerrogativas.
Veja a íntegra da proposta de fiscalização e controle
De acordo com a proposta, o foco da apuração será:
- o valor total da renúncia de receita gerada pelo programa;
- a distinção entre benefícios concedidos por vias judiciais e administrativas;
- a fruição do benefício antes e depois da exigência de habilitação prévia;
- o cumprimento das exigências legais, como a inscrição prévia no Cadastur;
- a concentração dos benefícios em grandes conglomerados econômicos;
- o impacto da renúncia fiscal nos preços ao consumidor final;
- a verificação da regularidade dos dados informados nas declarações das empresas;
- a checagem dos CNAEs preponderantes das beneficiárias.
Indícios de irregularidades
O pedido de investigação foi motivado por uma reportagem publicada pelo portal UOL em março, que denunciou a apropriação indevida do benefício por grandes grupos econômicos como redes de cinema, plataformas de streaming e conglomerados de alimentação , muitas vezes com atuação duvidosa no setor de eventos e sem o devido registro no Cadastur antes da pandemia, como exigido pela legislação.
A reportagem levantou suspeitas de que essas empresas teriam acessado o Perse por meio de decisões judiciais ou estratégias questionáveis de enquadramento, em prejuízo das pequenas e médias empresas que seriam o público-alvo do programa. “Os recursos públicos podem estar sendo desviados de sua finalidade original para subsidiar corporações com grande capacidade jurídica e financeira”, alertou Daniel Almeida na justificativa da proposta.
Transparência e responsabilização
Relator da proposta, o deputado Felipe Carreras afirmou que a fiscalização será conduzida com apoio técnico do TCU, de associações representativas do setor e da Tendências Consultoria. “Será uma auditoria construída a várias mãos. Há indícios de que empresas fora do escopo do programa foram beneficiadas indevidamente, o que precisa ser apurado”, disse.
Carreras adiantou ainda que o tema já foi levado ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e ao secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas. Segundo ele, se for confirmada a má utilização dos recursos, será necessário adotar medidas para garantir a devolução dos valores recebidos por empresas que não tinham direito ao benefício.
Criado em 2021, o Perse foi apontado como o maior pacote de incentivos fiscais já concedido ao setor de eventos no Brasil. A iniciativa foi essencial para assegurar a sobrevivência de empresas durante a pandemia, mas nos últimos meses passou a ser alvo de críticas e disputas em torno de sua prorrogação e alcance. Estima-se que as renúncias fiscais possam chegar a dezenas de bilhões de reais, o que reforça a necessidade de controle e fiscalização sobre a sua execução.