Escolha de Arthur Lira como relator mostra força do ex-presidente da Câmara na pauta legislativaTon Molina /Fotoarena/Folhapress
A escolha do deputado Arthur Lira como relator do projeto de reforma do Imposto de Renda (PL 1087/2025) não foi um mero acaso, mas uma decisão estratégica que reflete o peso político do parlamentar e seu papel central na condução da matéria. Como ex-presidente da Câmara e figura de ampla influência, Lira detém não apenas o conhecimento do pensamento médio da Casa, mas também a capacidade de articular maiorias, minimizando riscos de rejeição. Seu histórico sugere que, embora possa negociar ajustes no texto, dificilmente permitirá que o relatório seja derrotado, consolidando-se como peça-chave no desfecho da votação.
Isso, entretanto, não significa que o relator irá negar a isenção proposta pelo governo ou desfigurar completamente o projeto. Significa que ele promoverá modificações e ajustará algumas das fontes sugeridas para compensar a renúncia decorrente da isenção do imposto de renda das pessoas que recebem até R$ 5.000,00. Sobre isto, inclusive, seu próprio partido já apresentou uma proposta alternativa, que também não será acatada integralmente.
Nesse contexto, a dinâmica da disputa não se dará necessariamente entre governo e oposição, mas entre o relator e o Executivo. Caso haja divergências, a tendência é que a posição de Lira prevaleça, mesmo que isso signifique o apoio de parte da oposição e o afastamento de setores da base governista. O parecer do relator, portanto, torna-se o principal referencial para antever o resultado final, já que sua capacidade de articulação e influência supera as tradicionais divisões partidárias. A negociação direta com ele será mais decisiva do que qualquer estratégia de convencimento individual dos demais parlamentares.
Outro aspecto relevante é o controle que o relator exerce sobre o processo legislativo, evidenciado pela sua interferência na composição da comissão especial. O fato de o deputado Agnaldo Ribeiro, que foi relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma tributária, figurar como suplente, e não como titular, não é um detalhe menor: reflete a preferência ex-presidente da Casa por atuar soberano, sem dividir protagonismo. Essa postura reforça a centralização do processo em suas mãos, afastando possíveis competidores pela liderança do tema. A comissão, nesse sentido, tende a operar menos como um colegiado deliberativo com ampla liberdade e mais como um espaço moldado por sua influência.
Além disso, a experiência prévia na presidência da Câmara confere ao relator um trunfo adicional. Conhecedor das regras e dos ritos processuais, Lira pode acelerar ou retardar a votação conforme seus interesses, usando prazos e manobras regimentais para pressionar o governo ou obter concessões. O calendário da matéria, portanto, estará subordinado às suas prioridades, e não necessariamente à urgência do Planalto. Essa autonomia fortalece sua posição nas negociações, já que o Executivo depende de sua colaboração para evitar entraves.
Por fim, a escolha de um relator com tal perfil sinaliza que a reforma do IR, mesmo tendo um plano de trabalho que pretende ouvir vários especialistas, será menos um debate técnico e mais uma disputa política de alto nível, mediada por um ator com poder para definir os termos do acordo. Se o governo quiser avançar, precisará ceder em pontos sensíveis, pois o relator não apenas opinará, mas decidirá os contornos da proposta. Em última instância, o projeto que chegar ao plenário será, em grande medida, aquele que Arthur Lira considerar viável, um reflexo claro de como o poder legislativo, em certos momentos, se concentra nas mãos de poucos.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].