Daniel Rocha *
Quem ainda confia nos representantes? A literatura especializada tem apontado um quadro consistente de descrédito dos cidadãos em relação às instituições (Santos; Hoffman; Duarte, 2020). No caso brasileiro, esse sentimento parece estar ligado, sobretudo, à frustração das expectativas em relação ao funcionamento concreto dessas instâncias (Ribeiro, 2011). Segundo dados de uma pesquisa recente do INCT ReDem, 64% dos brasileiros afirmaram confiar pouco ou simplesmente não confiar no Congresso Nacional. Esse cenário evidencia o distanciamento entre a população e uma das principais instituições da democracia, o que dificulta a participação das pessoas nos debates e decisões que afetam toda a sociedade.
Fachada do Congresso NacionalPedro França/Agência Senado
O caso emblemático de 8 de janeiro de 2023, quando a Praça dos Três Poderes em Brasília foi invadida e depredada, tornou-se um marco do ódio e do rechaço direcionados aos representantes eleitos democraticamente. O viés ideológico por trás dessas ações violentas também se destaca como um elemento que deve ser observado. Dados da pesquisa do INCT ReDem mostram que a desconfiança no Congresso Nacional é generalizada entre indivíduos de diferentes posicionamentos ideológicos. No entanto, esse sentimento é especialmente acentuado entre os que se identificam com a extrema direita: 30,5% deles afirmam não ter nenhuma confiança na instituição.
Confiança no Congresso é baixa, entre todos os espectros políticosDaniel Rocha
Em certa medida, identificar os 30,5% da extrema direita que declaram não ter nenhuma confiança no Congresso Nacional é também sinalizar parte do conteúdo dessa insatisfação. O estudo recente de André Borges (2024, p. 2) aponta que a “nova direita” no Brasil se restringe a forças políticas que emergiram em reação aos governos do Partido dos Trabalhadores (PT) e que mantêm vínculos com movimentos e organizações da sociedade civil, especialmente de setores evangélicos. De um lado, a ênfase na bandeira anticorrupção e na defesa de pautas ultraliberais revela uma preferência por um Estado mínimo, com uma administração enxuta, tecnocrática e distante de estruturas tradicionais de representação. De outro, destaca-se a adesão a uma agenda conservadora nos costumes, sobretudo no que se refere aos direitos reprodutivos, à identidade de gênero e às políticas sociais, como cotas e programas de redistribuição de renda.
Diante desse cenário, a desconfiança no Congresso Nacional não é apenas uma questão de percepção institucional, mas reflete disputas políticas e culturais mais amplas sobre o papel do Estado e os rumos da democracia brasileira. Compreender os sentidos dessa desconfiança é essencial para interpretar os desafios contemporâneos da representação e do diálogo entre eleitores e eleitos.
* Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e bolsista de pós-doutorado do INCT ReDem.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].