“Tem gente safada, mas tem gente séria”, diz Lupi sobre INSS

“Tem gente safada, mas tem gente séria”, diz Lupi sobre INSS


Ao jornal O Globo, o ministro disse que “sabia o que estava acontecendo” e nega omissão a respeito de fraude

O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, defendeu, em entrevista ao jornal O Globo publicada no domingo (27.abr.2025), a equipe que trabalha no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), depois que a instituição foi alvo de denúncias sobre o aumento de descontos associativos não autorizados em aposentadorias, revelado em operação da PF (Polícia Federal). A investigação, que apura um desvio de mais de R$ 6 bilhões de 2019 a 2024, provocou a demissão de Alessandro Stefanutto, presidente do INSS.

Dos nomes que tive conhecimento da investigação da PF, deve ter uns 190 das associações e uns 10 ou 15 do INSS. Essa é a proporção. Vai ter gente safada dentro das instituições, claro. Mas a gente não pode misturar. Também tem gente séria, que quer servir, que está sendo injustiçada.”

Na entrevista, Lupi também admitiu que tinha conhecimento das denúncias de fraude, e justificou por quê demorou para tomar providências. “No governo, tudo é demorado. Eu sabia o que estava acontecendo, das denúncias. Eu sabia que estava havendo um aumento muito grande [dos descontos], que precisava fazer uma instrução normativa para acabar com isso e comecei a me irritar pela demora. Só que o tempo no governo não é o tempo de uma empresa privada”, afirmou o ministro ao jornal.

Lupi voltou a negar que tenha sido omisso, como o fez também em entrevista à Folha de S. Paulo, e disse que não se sente em situação fragilizada no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Se sou omisso, por que pedi o relatório e demiti o diretor? Quem é omisso não demite ninguém. Esse desconto associativo existe há muitos anos e sempre teve muita denúncia na Ouvidoria.

A publicação questionou Lupi sobre a demora para o assunto entrar na pauta oficial da instituição. Segundo Tônia Galleti, conselheira do CNPS (Conselho Nacional da Previdência Social), o ministro havia sido alertado do aumento dos descontos em junho de 2023, mas o tema só foi incluído na pauta em abril de 2024.

Lupi respondeu que, depois que Galleti trouxe a questão à tona, ele havia pedido a Stefanutto e ao diretor de Benefícios, André Fidelis, também integrantes do CNPS, que examinassem o que estava acontecendo. “Foi passando o tempo e o diretor de Benefícios não apresentava nada. Eu o demiti e nomeei o Vanderelei Barbosa para o lugar dele. 3 meses depois, Vanderlei me apresentou o relatório”, disse.

O ministro acrescentou que, além de Galetti, outras pessoas já haviam feito denúncias, mas que eram necessários “fatos concretos para serem investigados”.

Segundo Lupi, foi feita uma IN (Instrução Normativa) para coibir os aumentos e mais de 2,4 milhões de autorizações foram canceladas por estarem em desacordo com a IN. O ministro também disse que as 10 associações que concentraram 65% dos descontos fizeram um investimento massivo para atrair mais filiados.

Todo mês, entra 1 milhão de pessoas pedindo aposentadoria, pensão, benefício por incapacidade e cerca de 30% ou 40% desses procedimentos são aceitos. Logo, esse público vai sendo assediado por essas associações, por ofertas de consignado. Como eu vou controlar isso? Antes de receber aposentadoria, você já recebe telefonema de oferta de empréstimo. É uma coisa muito difícil de controlar, é muita gente. Tudo na Previdência é gigantesco”, afirmou.

INVESTIGAÇÃO

A PF deflagrou na 4ª feira (23.abr) a operação Sem Desconto para apurar as fraudes no INSS. O prejuízo estimado é de R$ 6,3 bilhões no período de 2019 a 2024.

Durante a ação, foram cumpridos 211 mandados de busca e apreensão, 6 mandados de prisão temporária e ordens de sequestro de bens que somam mais de R$ 1 bilhão. A operação foi realizada em 13 Estados, incluindo São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Ceará e também no Distrito Federal

O governo informou que 6 pessoas foram afastadas de suas funções por determinação da Justiça Federal. A CGU (Controladoria Geral da União) também participou das investigações.

COMO FUNCIONAVA O ESQUEMA

Segundo a PF, o esquema envolvia entidades de classe que realizavam descontos diretamente nos benefícios de aposentados e pensionistas, sem autorização. Os valores eram cobrados como mensalidades associativas, mas não havia prestação efetiva de serviços.

Auditoria da CGU apontou que 70% das 29 entidades analisadas não entregaram a documentação exigida pelo INSS. Em entrevistas da CGU com 1.300 beneficiários, a maioria declarou não ter autorizado nenhum desconto. Entre as entidades envolvidas estão Ambex, Contag, Caap e outras 9 com Acordos de Cooperação Técnica firmados de 1994 a 2023.

A investigação identificou falhas na verificação da autorização dos beneficiários e indícios de falsificação de documentos. As entidades assinavam acordos com o INSS que permitiam os descontos, mas muitos eram aplicados sem consentimento dos segurados.

QUANDO COMEÇARAM AS INVESTIGAÇÕES

A CGU iniciou as apurações em 2023, ao perceber o aumento expressivo no número de entidades conveniadas e nos valores descontados de beneficiários.

Foram realizadas auditorias em 29 entidades com acordos de cooperação e conduzidas entrevistas com 1.300 aposentados que tinham descontos em folha de pagamento.

Os crimes investigados incluem:

  • corrupção ativa e passiva;
  • organização criminosa;
  • lavagem de dinheiro;
  • falsificação de documentos;
  • violação de sigilo funcional.

A PF informou ter apreendido carros de luxo, dinheiro em espécie, joias e obras de arte. Os valores exatos ainda estão sendo contabilizados.

QUEM FOI AFASTADO

O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, informou nesta 4ª feira (23.abr) os nomes de 5 funcionários afastados, além do presidente do INSS. São eles:

  • Alessandro Stefanutto – presidente do INSS;
  • Virgílio Ribeiro de Oliveira Filho – procurador-geral do INSS;
  • Vanderlei Barbosa dos Santos – diretor de Benefícios e Relacionamento;
  • Giovani Batista Fassarella Spiecker – coordenador de Suporte ao Atendimento;
  • Jucimar Fonseca da Silva – coordenador de Pagamentos e Benefícios.

Além deles, foi afastado um policial federal, cuja identidade não foi divulgada.

QUEM É ALESSANDRO STEFANUTTO?

Alessandro Antonio Stefanutto assumiu a presidência do INSS em julho de 2023, nomeado pelo ministro da Previdência Social, Carlos Lupi. É procurador federal de carreira e atua na autarquia há 25 anos. Já ocupou o cargo de procurador-geral do órgão de 2011 a 2017.

Graduado em direito pela Universidade Mackenzie, tem pós-graduação em gestão de projetos e mestrado em gestão e sistemas de seguridade social pela Universidade de Alcalá, na Espanha. É filiado ao PSB (Partido Socialista Brasileiro).

Durante sua gestão, a fila do INSS chegou a quase 2 milhões em fevereiro de 2025, o maior número desde 2020.

QUAL A ORIENTAÇÃO PARA OS BENEFICIÁRIOS?

A orientação do governo aos beneficiários é que, caso identifiquem descontos indevidos de mensalidade associativa no extrato de pagamento (contracheque), façam o pedido de exclusão por meio do aplicativo ou site “Meu INSS”.

A exclusão é automática e pode ser realizada sem necessidade de comparecimento presencial.

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