Congresso em Foco

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A deputada federal Marussa Boldrin (MDB-GO), de 34 anos, revelou publicamente nesta segunda-feira (28) que foi vítima de violência doméstica durante anos de relacionamento com o ex-marido, do qual se divorciou recentemente. O desabafo foi feito por meio de uma carta aberta publicada em suas redes sociais, em que a parlamentar relata episódios de agressões físicas, abuso psicológico e violência moral (veja a íntegra mais abaixo).

Marussa fez desabafo nas redes sociais:

Marussa fez desabafo nas redes sociais: “Hoje começo um novo capítulo na minha vida”Zeca Ribeiro/Agência Câmara

“Dizer isso em voz alta já é, por si só, um ato de coragem”, escreveu Marussa, destacando a dificuldade de romper o silêncio após anos de sofrimento. A publicação gerou ampla repercussão e solidariedade entre colegas parlamentares, entidades de defesa dos direitos das mulheres e lideranças políticas.

Denúncia e medidas legais

No texto, Marussa relatou ter sido vítima de duas agressões físicas a primeira em 2023 e a segunda em 2025, quando decidiu procurar a polícia, registrar boletim de ocorrência e solicitar uma medida protetiva baseada na Lei Maria da Penha. “Porque não cabe amor onde existe violência”, afirmou.

A denúncia foi registrada na Delegacia de Polícia de Rio Verde (GO), a 230 km de Goiânia, na região sudoeste do estado. A deputada também realizou exame de corpo de delito para embasar as medidas judiciais. Marussa, que é autora de projetos de lei voltados à proteção das mulheres na Câmara dos Deputados, como o que propõe aumento de pena para feminicídios em áreas rurais, afirmou que decidiu agir para interromper o ciclo de violência.

Embora não cite o nome do ex-marido, Marussa foi casada com Sinomar Júnior, ex-superintendente da Secretaria de Esporte e Lazer de Goiás. O Congresso em Foco não conseguiu localizar o ex-superintendente. O espaço está aberto para atualização.

Anos de silêncio e sofrimento

Marussa afirmou que, durante muito tempo, permaneceu calada, acreditando que a maternidade e o amor poderiam transformar o relacionamento. “Me calei por medo, por vergonha, por acreditar que tudo ia mudar”, escreveu. A tentativa de manter a família unida, inclusive com a gestação do segundo filho, não impediu que os abusos se agravassem. “Fui xingada, maltratada, ameaçada e humilhada, criando, infelizmente, uma rotina de sofrimento”, declarou.

Segundo a parlamentar, Sinomar Júnior teria se reaproximado dela apenas ao perceber seu crescimento político. “Ele se reaproximou não por mim, mas pelo interesse no que eu representava”, denunciou.

Marussa revelou que a Justiça reconheceu os abusos e oficializou o divórcio, garantindo-lhe a guarda dos filhos. Antecipando possíveis ataques, a deputada alertou que tentativas de descredibilizar sua denúncia podem surgir por motivações políticas: “Vão usar esse episódio como uma manobra para tentar abafar os abusos que vivi, e eu não vou aceitar isso”.

Novo recomeço

A deputada encerra a carta aberta reforçando que sua decisão de falar veio não apenas por ela, mas por outras mulheres que vivem situações semelhantes. Hoje, eu começo a escrever um novo capítulo da minha vida. Um capítulo de cura, de força, de dignidade, afirmou.

Marussa Boldrin está em seu primeiro mandato de deputada federal. É engenheira agrônoma formada pela Universidade de Rio Verde (UniRV), pós-graduada em Planejamento Urbano e Ambiental e mestre em Ciências Agrárias e Agronomia pelo Instituto Federal Goiano (IF Goiano). Empresária e produtora rural, é proprietária do Solo Forte – Laboratório de Análise Agrícola. A deputada é vice-presidente para a região Centro-Oeste da Frente Parlamentar da Agropecuária.

Antes de chegar à Câmara dos Deputados, foi vereadora em Rio Verde por dois mandatos (2016 e 2020), inicialmente eleita pelo PTN. Em 2022, conquistou uma vaga como deputada federal pelo MDB, com 80.464 votos. Rio Verde é uma das cidades do agro mais ricas do país e tem mais de 220 mil habitantes.

No Instagram, Marussa recebeu o apoio da também deputada goiana Silvye Alves (União): “Você sabe que pode contar comigo sempre, Marussa Boldrin. Deus vai te fortalecer e você vai SIM recomeçar, porque você merece ser feliz e, acima de tudo, merece paz, respeito, reconhecimento e merece também viver em um lar livre de qualquer agressão, assim como seus filhos. Receba meu abraço, meu apoio e tô com você nessa caminhada, flor!!!”

“Por todas as mulheres que já silenciaram sua dor

Eu estive em um relacionamento abusivo. Dizer isso em voz alta já é, por si só, um ato de coragem. Durante anos, fui silenciada dentro da minha própria casa. Fui desvalorizada, desacreditada, diminuída como mulher, como mãe e como profissional. E, por muito tempo, acreditei que suportar em silêncio era o caminho. Hoje, sei que não era.

Me casei acreditando no amor, acreditando na parceria. Tínhamos uma filha a caminho, uma vida inteira pela frente e muitos sonhos a serem vividos. Mas, logo após o nascimento da minha primeira filha, o homem que havia jurado cuidar de mim se afastou, emocional e fisicamente, e as agressões psicológicas começaram. Eu tentava compreender, tentava reconectar, insistia no que já não existia. Não casei para separar repeti isso tantas vezes para mim mesma.

Insisti, mesmo quando ele passou a me ferir com palavras. Quando dizia que meu trabalho não prestava, que eu era incompetente. Quando desdenhava do meu mandato, usando até mesmo palavras de baixo calão. Quando dizia sentir nojo do meu leite enquanto eu amamentava. Ainda assim, eu me calava. Por medo, por vergonha, por acreditar que tudo ia mudar. Eu me calei. E me arrependo profundamente de ter silenciado a minha voz.

Enquanto eu lutava na vida pública, ele me sabotava na vida privada. Nunca me apoiou com sinceridade, apenas por conveniência. Nem mesmo compareceu à minha posse de reeleição como vereadora. Eu seguia tentando. Mesmo depois de descobrir uma traição, em que a outra pessoa chegou a me mandar mensagem expondo o relacionamento entre eles, tentei reconstruir. Engravidei do segundo filho mais uma vez tentando corrigir a rota do abuso com amor. Ao invés da relação dar sinais de melhora, os abusos se transformaram em pesadelos diários e a pressão psicológica e moral passaram a ser regra dentro de um lar que deveria ser um porto seguro.

Fui xingada, maltratada, ameaçada e humilhada criando, infelizmente, uma rotina de sofrimento. Me agarrei à falsa esperança de que o amor pudesse curar o que, na verdade, era abuso. Mas não há cura quando não há respeito. Não há reconstrução possível onde há destruição emocional diária.

A distância entre nós passou a ser questão de segurança para mim e quando decidi avançar na política almejando um cargo maior, ele se reaproximou não por mim, mas pelo interesse no que eu representava.

E, mais uma vez, me iludi acreditando que a prestatividade dele era real, mas o tempo provou que eu estava errada. Ele continuou a me machucar psicologicamente e a me humilhar moralmente. E, em 2023, ultrapassou todos os limites: me agrediu fisicamente pela primeira vez. Eu tive medo. Tive vergonha e optei por não contar nem para minha família, que já havia entendido o relacionamento abusivo em que eu estava.

Pensando em proteger nossos filhos do trauma de um divórcio e com medo de expor minha vida em público, decidi seguir com medo.

Nos últimos tempos, minha vida ganhou intensidade. Me dividi entre Brasília e meus filhos, entre compromissos e a maternidade. Direcionei todo meu amor para meus pequenos. Sempre fui mãe, mesmo sob ameaças. Mesmo ouvindo gritos e ofensas e sofrendo agressões. Passamos a coexistir no mesmo ambiente, dividindo apenas o mesmo teto. Eu estava sozinha, buscando forças para sair de um relacionamento que nunca deveria ter sido construído. Em 2025 resolvi seguir com minha vida para tentar voltar a ter paz, ele reagiu com ódio e me espancou pela segunda vez, agora com mais intensidade. E finalmente resolvi falar. Tive coragem de procurar a delegacia, de fazer o boletim de ocorrência, o corpo de delito, e pedir uma medida protetiva. Porque não cabe amor onde existe violência.

Eu sobrevivi.

Busquei em Deus a força e a coragem que eu precisava, e agora, finalmente, eu falei. Falei por mim e por todas as mulheres que sofrem em silêncio. Falei porque quero viver feliz, e a felicidade só é possível com paz. Tomei meu primeiro passo para romper de vez esse ciclo. Meu divórcio já foi consumado pela justiça que entendeu os abusos que vivi e me garantiu a guarda dos meus filhos.

A justiça já conhece a minha verdade, e sei que para uma pessoa que só conhece a agressão, falta a ele tentar agredir minha imagem de maneira pública. Vão usar desse infeliz episódio como uma manobra política para tentar abafar os abusos que vivi em troca de desgaste de imagem e eu não vou aceitar isso.

Eu vou resistir assim como eu já resisti aos abusos morais e físicos. Eu sei que tenho a verdade ao meu lado e mais: tenho minha história, meu trabalho limpo e o apoio de quem sempre me viu com respeito.

Não quero mais carregar essa dor calada. Não quero mais fingir que está tudo bem. Não aceito mais ser abusada, nem física, nem moral, nem psicologicamente. E se você, mulher, estiver lendo isso e vivendo algo parecido, saiba: você não está sozinha. Não tenha medo de denunciar, de pedir ajuda, de buscar sua liberdade.

Hoje, eu começo a escrever um novo capítulo da minha vida. Um capítulo de cura, de força, de dignidade.

Por mim. Pelos meus filhos. Por todas nós.

Marussa”



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