Estado retira famílias para construção de parque; moradores protestam contra demolições
O governo de São Paulo iniciou nesta 3ª feira (22.abr.2025) a remoção de famílias da Favela do Moinho, localizada nos Campos Elíseos, região central da capital paulista.
A decisão de desocupar a favela é acompanhada pelo governo federal. A área, que pertence à União, está em processo de cessão para a administração de Tarcísio de Freitas (Republicanos). O governador quer utilizar o espaço como parte do projeto Parque do Moinho.
A remoção dos moradores faz parte de um processo classificado pelo Palácio dos Bandeirantes como “mudança programada” para realocar as famílias para empreendimentos habitacionais da CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo).
O governo federal afirmou que apoia a mudança de quem já possui um novo endereço, “desde que essa seja a efetiva vontade das famílias e feitas sem intervenção de força policial“.
A SPU (Secretaria de Patrimônio da União) do Ministério da Gestão e da Inovação declarou em nota que mais de 800 famílias moram na Favela do Moinho e “a principal preocupação é onde as famílias serão realocadas”.
Segundo a secretaria, o processo de cessão da área ainda depende de ajustes, detalhamento do projeto e cumprimento das garantias de moradia para as pessoas afetadas.
O governo de São Paulo afirma que 87% das famílias da favela iniciaram o processo de adesão a novos programas habitacionais, com 719 em fase de habilitação.
Para aquelas cujas unidades ainda não estão prontas, foram oferecidos auxílio mudança de R$ 2.400 e auxílio moradia de até R$ 800 a partir do 2º mês de remoção.
Além disso, o Estado afirma que as ações na região também seriam uma questão de segurança. Em agosto de 2024, 11 pessoas foram denunciadas por ligação com o PCC (Primeiro Comando da Capital), que tinham como base de suas atividades a Favela do Moinho.
A desocupação tem sido marcada por protestos. Os moradores alegam que o governo está realizando a remoção de maneira forçada, sem considerar as dificuldades financeiras da comunidade.
Uma moradora, que não será identificada por questões de segurança, afirmou ao Poder360 que houve uso de força policial e que todos foram pegos de “de surpresa”, sem aviso prévio de que as remoções começariam nesta 3ª feira.
“A gente tem que sair, mas o problema é que está complicado achar uma moradia. Eles querem que a gente saia de um jeito ou de outro. Aqui a polícia toda hora está entrando, a polícia está jogando spray de pimenta até nas crianças“, declarou.
O Poder360 tentou contato com a Polícia Militar de São Paulo e com a Secretaria de Segurança do Estado, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem. O espaço segue aberto.
A vereadora Luna Zarattini (PT) disse que a população local tem sido pressionada a aceitar as propostas. “Moradores afirmam que foram coagidos a declarar renda superior à real para se enquadrar no modelo de financiamento proposto“, declarou ao Poder360. Ela também afirmou que a Polícia Militar tem atuado de maneira ostensiva no território.
Leia a nota da Polícia Militar de São Paulo:
“A Polícia Militar do Estado de São Paulo acompanha, da área externa da comunidade, o processo de reassentamento das famílias da Favela do Moinho. O objetivo é garantir a segurança de todos os moradores, bem como dos profissionais envolvidos na operação. A Corporação também monitorou, nos últimos dias, as manifestações contrárias ao reassentamento, atuando para preservar a ordem pública e preservar os direitos de todos os cidadãos. As ações da Polícia Militar são pautadas por critérios técnicos e no absoluto respeito às leis.”
Leia a nota da Secretaria de Patrimônio da União:
“O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), por meio da Secretaria de Patrimônio da União (SPU), está em diálogo permanente com o governo de São Paulo para encontrar uma solução para as mais de 800 famílias que moram na Favela do Moinho em SP. A principal preocupação é onde as famílias serão realocadas. As informações até agora disponíveis ainda não são claras sobre o endereço efetivo e o prazo de entrega dessas unidades. O governo federal apoia as ações de mudança das famílias que já possuem um novo endereço, como as que estavam programadas para esta terça-feira (22), desde que essa seja a efetiva vontade das famílias e feitas sem intervenção de força policial.
“A SPU/MGI esclarece ainda que o governo do estado solicitou a cessão da área para a implantação do Parque do Moinho. Ainda não há previsão para a cessão, pois o processo de transferência do terreno está condicionado à garantia do direito à moradia das famílias que vivem no local e depende de ajustes e complementações, por parte da CDHU/SP, no plano de reassentamento enviado em abril deste ano.
“A SPU também aguarda a entrega do detalhamento do projeto a ser implantado na área pelo governo de SP, a fim de que seja definido o instrumento de destinação a ser utilizado. Somente após esse acordo será possível avançar nos trâmites administrativos para a formalização do contrato de cessão.”
Leia a nota do governo de São Paulo:
“COMUNICADO SOBRE A FAVELA DO MOINHO
“O Governo de São Paulo iniciou nesta terça-feira (22) as mudanças de famílias da Favela do Moinho. A mobilização é resultado de um processo que vem sendo realizado ao longo do último ano e já conta com 87% de adesão da comunidade. O reassentamento tem como objetivo levar dignidade e segurança a essa população, que vive em condições insalubres e sob elevado risco. Neste primeiro dia, estão previstas 11 mudanças.
“A ação do Estado se dá tendo em vista o alto risco a que as pessoas estão submetidas: a comunidade está localizada entre linhas de trens, em uma área murada, com apenas uma entrada e baixa possibilidade de escoamento. Há ainda a alta densidade de moradias e a elevada incidência de fiação exposta. Na última década, foram registrados dois incêndios de grandes proporções que deixaram mortos e centenas de desabrigados.
“Além disso, a linha férrea está no mesmo nível da comunidade, expondo as pessoas, principalmente crianças, a risco nos momentos em que os trens passam pelo local. Esse conjunto de características inviabiliza a regularização da área.
“CONSTRUÇÃO PELO DIÁLOGO
“O plano de reassentamento foi construído com base em diálogo contínuo. Foram 13 reuniões em grupo com a comunidade, envolvendo também a Defensoria Pública, advogados indicados pelos moradores, Superintendência do Patrimônio da União, Prefeitura e lideranças dos movimentos, além da CDHU. Além disso, foram realizados mais de 2 mil atendimentos individuais, facilitados pela instalação de um escritório da Companhia a apenas 500 metros da favela, o que garantiu acesso à informação, atendimento individualizado e liberdade de escolha para os moradores quanto ao futuro.
“ADESÃO VOLUNTÁRIA EM MASSA
“A adesão voluntária da comunidade já passa de 87% do total de famílias: são 719 que iniciaram o processo de adesão, de um total de 821. Destas, 558 já estão habilitadas, ou seja, já estão aptas a assinar contratos e receber as chaves assim que as unidades estiverem prontas. Até agora, 496 já escolheram o imóvel de destino para atendimento final, mesmo número que já iniciou o processo para recebimento de auxílio moradia.
“MORADIA GARANTIDA NO CENTRO
“Das mais de 1,5 mil moradias que foram disponibilizadas para os moradores da comunidade, mais de mil estão localizadas no centro da capital — em bairros como Brás, Vila Buarque, Campos Elíseos e Barra Funda — quantidade suficiente para atender todas as famílias da comunidade. As demais 499 unidades estão distribuídas por outras regiões da cidade, como Jaraguá, Vila Matilde, Chácara Califórnia, Ipiranga e Cachoeirinha, entre outros. A escolha da moradia é feita por cada família, conforme suas necessidades e vínculos com a região.
“REGRAS DE FINANCIAMENTO
“Foram oferecidas unidades em 25 empreendimentos para escolha dos moradores, além da possibilidade de irem ao mercado buscar imóveis para financiamento via Carta de Crédito Individual. Nos dois casos, as parcelas comprometem 20% da renda familiar, de acordo com a legislação que rege a política habitacional paulista. Para quem recebe um salário mínimo, o subsídio do Estado chega próximo de 70% do total do valor do imóvel.
“Famílias cujas unidades definitivas ainda não estão prontas receberão auxílio mudança, no valor de R$ 2,4 mil, e auxílio moradia de R$ 800 a partir do segundo mês. Os valores serão divididos igualmente entre Estado e Prefeitura de São Paulo.
“EMPREGO, RENDA E ASSISTÊNCIA SOCIAL
“No escritório da CDHU próximo ao Moinho, também estão sendo desenvolvidas ações complementares para auxiliar a comunidade sob os pontos de vista social e econômico. Em parceria com a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS), foi disponibilizada uma van por uma semana para atualização cadastral no CadÚnico. A ação resultou em 180 atendimentos e 125 cadastramentos. A manutenção do CadÚnico em dia permite acesso a tarifas sociais de serviços públicos essenciais, bem como a programas assistenciais de transferência de renda, como Bolsa Família e Benefício de Prestação Continuada (BPC), entre outros.
“Também em parceria com o município, por meio da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho (SMDET), foi realizado um mutirão do CATe, nos dias 9 e 10 de abril, para oferecer 400 vagas de emprego aos moradores do Moinho. Para capacitação profissional, foi realizada uma mentoria da Adesampa (também vinculada à SMDET) para capacitação de microempreendedores individuais (MEIs), com foco tanto na abertura de empresas quanto na qualificação de negócios já existentes, com 60 atendimentos registrados.
“PARQUE DO MOINHO
“A Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) planeja requalificar toda a área da Favela do Moinho, localizada nos Campos Elíseos, região central da capital paulista. Está prevista a implantação do Parque do Moinho, ao longo do trajeto de intervenção, como forma de devolver o espaço público para a cidade e impedir novas ocupações.
“Para dar andamento ao projeto, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (SDUH) pleiteia junto ao Governo Federal a cessão de parte da área da Favela do Moinho pertencente à União para a construção do equipamento público.
“CRIMINALIDADE
“Durante o combate à criminalidade nas Cenas Abertas de Uso, no centro de São Paulo, investigações realizadas pelas forças de segurança do Estado apontaram que a Favela do Moinho é um entreposto para o tráfico de drogas, ou seja, um ponto estratégico para a distribuição de entorpecentes na região.
“Na Operação Salus et Dignitas, o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Tráfico de Drogas) denunciou 11 pessoas por crimes de organização criminosa, tráfico de drogas e lavagem de capitais. Os acusados, ligados ao PCC, tinham como base de suas atividades ilícitas a Favela do Moinho.
“Os trabalhos desmantelaram, inclusive, um sistema de antenas para interceptação de sinais de telecomunicações das polícias, o que permitia aos criminosos antever ações de combate ao tráfico.
“A operação é resultado de mais de um ano de trabalho de inteligência e investigação das forças de segurança do Estado. Ao todo, cinco mandados de prisão foram cumpridos, entre eles o de Leonardo Monteiro Moja, que foi preso na Praia Grande. Conhecido como Leo do Moinho, ele é um dos líderes do PCC e apontado como proprietário de hotéis e estabelecimentos no centro da capital. Os locais eram registrados em nome de laranjas e funcionavam como pontos de tráfico de drogas.”