Advogado Paulo Renato Garcia respondia às alegações de irregularidades na agência; ministra argumenta que a responsabilidade sobre a eleição é de “outro Poder”
O advogado Paulo Renato Pinto, que representa a defesa do ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), foi rebatido pela ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Cármen Lúcia nesta 3ª feira (25.mar.2025) após afirmar ser função da Abin apurar as urnas eletrônicas. Fala se deu durante o julgamento da denúncia da PGR (Procuradoria Geral da República) sobre o planejamento de um golpe de Estado.
O argumento da defesa é contra a alegação do procurador geral da República, Paulo Gonet, de que o denunciado instituiria um grupo de trabalho na Abin para conferir a confiabilidade dos equipamentos. Renato Pinto disse que sequer há provas de que o grupo realmente foi criado. Ainda, citou que o convênio da agência com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) é prova da responsabilidade da agência sobre as urnas.
A ministra, então, pediu a palavra para perguntar ao advogado: “Vossa Excelência disse ser dever da Abin apurar a segurança e a fiscalização das urnas no processo eleitoral? É essa a frase de Vossa excelência? Vossa Excelência anotou ‘urnas’, e urnas são de outro Poder”.
Durante a sustentação oral, a defesa alegou que só 3 arquivos de textos foram apresentados pela PGR para imputar crimes contra o deputado. Disse que os arquivos não trazem algo “novo” e são provas “tímidas”, uma vez que as falas de Ramagem diziam “somente que as urnas não eram seguras”. Segundo Renato Pinto, as provas são “mais do mesmo”.
Afirmou que Ramagem sugeria, sim, que medidas judiciais fossem conferidas ao crivo da AGU (Advocacia Geral da União), mas para que agentes públicos pudessem ter respaldo para cumprir as determinações, e não “descumprirem”.
MONITORAMENTO DE AUTORIDADES
Sobre o uso irregular da ferramenta First Mile, disse que o seu uso foi descontinuado na gestão de Ramagem em maio de 2021. A ferramenta israelense permite monitorar pessoas usando apenas o número de telefone sem qualquer autorização judicial.
Quando foi alvo de uma operação da PF (Polícia Federal) que apura suposta espionagem ilegal da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) negou, em 2023, quaisquer irregularidades no programa First Mile.
Também defendeu que a “radicalização de falas e atos” do grupo envolvido na denúncia se deu a partir de julho de 2022, em um momento em que o congressista já não poderia mais ser parte do núcleo do alto escalão do governo que coordenava o plano de golpe, já que sua atenção se voltou à disputa eleitoral que se aproximava e que o elegeu em outubro daquele ano.
Sobre a colaboração premiada do ex-ajudante de ordens do governo Mauro Cid, falou que “Cid não deu relevo à participação de ramagem para que fosse integrante de um núcleo crucial para um golpe”.
DENÚNCIA CONTRA RAMAGEM
A defesa do deputado apresentou seus argumentos durante sustentação oral na 1ª Turma do STF (Supremo Tribunal Federal). O colegiado formado por 5 ministros analisa as acusações e ouve as defesas para decidir se aceitam ou rejeitam a denúncia da PGR (Procuradoria Geral da República) e iniciam uma ação penal contra os envolvidos.
Dentre os 34 denunciados por golpe, Ramagem é o único com foro privilegiado. Por isso, o inquérito está sendo julgado pela Suprema Corte.
Ramagem foi denunciado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, em 18 de fevereiro deste ano, junto a mais 33 pessoas, no inquérito que apura uma tentativa de golpe de Estado logo depois das eleições presidenciais de 2022, vencidas por Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A organização criminosa que teria tentado um golpe também planejou as mortes de Alexandre de Moraes, Lula e seu vice Geraldo Alckmin (PSB), segundo as investigações.
ABIN PARALELA
Para a PGR, durante o período em que o delegado Alexandre Ramagem esteve no comando da Abin, houve a utilização indevida de ferramentas de inteligência para monitoramento e desinformação contra opositores do governo.
A denúncia também diz que o ex-diretor “supervisionou e teve pleno conhecimento” da célula infiltrada na agência. Ele foi apontado como responsável por autorizar e permitir que os membros, de dentro da agência, criassem e espalhassem desinformação através de perfis falsos e cooptados nas redes sociais, direcionando ataques a figuras políticas e institucionais de oposição.
A célula era composta pelo policial federal Marcelo Araújo Bormevet e o sargento do Exército, cedido à Abin, Giancarlo Gomes Rodrigues. O grupo teria o apoio ainda do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), comandado por Augusto Heleno Ribeiro Pereira.
Segundo as investigações, Bormevet era um “homem de confiança” de Ramagem. Foi nomeado chefe do CIN (Centro de Inteligência Nacional) da Abin. Em 2018, integrou a equipe de segurança do ex-presidente Bolsonaro.
Bormevet trocava diálogos frequentes com Rodrigues relacionados a opositores de Bolsonaro e pedia o monitoramento desses opositores. Deu ordens a Rodrigues para, por exemplo, mandar “bala” e “sentar o pau” em um assessor do então presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Luís Roberto Barroso.
Segundo a denúncia, as atividades “paralelas” começaram em 2019 e se intensificaram em 2021. Foi encontrado um documento com Alexandre Ramagem, intitulado “Presidente TSE informa.docx”, com metadados que indicavam que ele mesmo estava orientando Bolsonaro a fortalecer a narrativa de fraude em suas lives e discursos públicos.
JULGAMENTO
A 1ª Turma do Supremo aprecia desta 3ª feira (25.mar) até 4ª feira (26.mar) a denúncia contra Bolsonaro e 7 aliados. Os ministros decidem se há elementos fortes o suficiente para iniciar uma ação penal. Caso aceitem a denúncia, os acusados se tornam réus.
O julgamento se refere só ao 1º dos 4 grupos de denunciados. Trata-se do núcleo central da organização criminosa, do qual, segundo as investigações, partiam as principais decisões e ações de impacto social. Estão neste grupo:
- Jair Bolsonaro (PL), ex-presidente da República;
- Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e deputado federal;
- Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
- Augusto Heleno, ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional);
- Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
- Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; e
- Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e candidato a vice-presidente em 2022.
PRÓXIMOS PASSOS
Se a denúncia for aceita, dá-se início a uma ação penal. Nessa fase do processo, o Supremo terá de ouvir as testemunhas indicadas pelas defesas de todos os réus e conduzir a sua própria investigação. Terminadas as diligências, a Corte abre vista para as alegações finais, quando deverá pedir que a PGR se manifeste pela absolvição ou condenação dos acusados.
O processo será repetido para cada grupo denunciado pelo PGR, que já tem as datas marcadas para serem analisadas. São elas: