Congresso em Foco

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*Escrito em parceria com Raul Bonfim, Diretor de Monitoramento de Políticas Públicas da Secretaria de Planejamento do Piauí (Seplan-PI).

No último texto que escrevemos, tratamos sobre o embate entre o Legislativo e o Judiciário em torno das emendas orçamentárias. O cerne da discussão incide sobre a falta de transparência no processo de destinação das emendas de comissão, que tiveram seus recursos ampliados significativamente nos últimos anos.

No final de 2024, o Supremo Tribunal Federal (STF), mais precisamente o ministro Flávio Dino, decidiu pelo bloqueio do pagamento dessa modalidade de emenda. Na decisão, Dino questionou a falta de clareza quanto à destinação desses recursos, o que poderia comprometer a transparência e o princípio democrático da alocação orçamentária.

Congresso aprovou nova resolução para regulamentar emendas antes de votar o orçamento.

Congresso aprovou nova resolução para regulamentar emendas antes de votar o orçamento.Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Diante da crise institucional gerada pela decisão do STF, Executivo, Legislativo e Judiciário negociaram um acordo no final do ano, buscando uma solução para viabilizar a execução orçamentária desses recursos sem ferir a transparência e, consequentemente, a pluralidade de vozes institucionais em torno da deliberação das emendas de comissão.

Como consequência desse acordo, o Legislativo aprovou o projeto de Resolução 1/2025, que altera a Resolução 1/2006 do Congresso Nacional, modificando as regras de funcionamento da Comissão Mista de Orçamento. Entre os principais pontos destacados na normativa está a necessidade de construção de atas e de justificativas mais detalhadas sobre o processo de alocação das emendas. No caso das emendas de comissão, ficou determinado que após a aprovação da Lei Orçamentária Anual (LOA), os líderes partidários deverão ouvir suas bancadas, conforme a Lei Complementar nº 210/24.

Há questionamentos em relação a esse modelo, pois ele ainda não permite determinar a discriminação do autor final das emendas de comissão, uma vez que as indicações ficarão a cargo dos líderes partidários.

Não é novidade o uso de resoluções para enfrentar crises decorrentes do mal uso dos recursos públicos pelo Congresso Nacional. Por exemplo, diante do escândalo dos “Anões do Orçamento”, em 1993, em que parlamentares utilizavam as emendas parlamentares para desviar recursos públicos, o Legislativo aprovou a Resolução n 2 de 1995 CN, definindo regras e procedimentos transparentes para a atuação dos legisladores sobre a elaboração do orçamento.

Além disso, o novo ordenamento descentralizou o poder do relator-geral do PLOA, transferindo parte de suas prerrogativas institucionais de análise do orçamento para as subcomissões temáticas e para os relatores-adjuntos e setoriais, impondo maior controle sobre a distribuição dos recursos e buscando evitar novas irregularidades.

É importante destacar, no entanto, que as Resoluções de 1995 e 2025 apresentam diferenças significativas. Enquanto a primeira descentralizou o poder, limitando a influência do relator-geral e reforçando o papel dos órgãos colegiados, a mais recente adotou uma lógica inversa. O projeto de Resolução de 2025 reduziu a capacidade deliberativa das comissões e fortaleceu o papel das lideranças partidárias na destinação dos recursos, concentrando o poder na cúpula do Congresso.

Esse movimento representa um enfraquecimento dos processos de deliberação e transparência em torno das emendas, pois restringe o debate legislativo e afasta o processo orçamentário do escrutínio das comissões, instâncias que devem garantir maior pluralidade na alocação dos recursos públicos por contarem com parlamentares afeitos à expertise temática de cada comissão. O próprio ministro Flávio Dino já solicitou, nesta terça-feira, 18 de março, explicações sobre a nova resolução à Advocacia Geral da União e ao Congresso Nacional, principalmente diante dos questionamentos quanto à ausência de transparência quanto aos parlamentares que indicam emendas.

É importante continuar acompanhando se as decisões do Legislativo atenderão às demandas do STF, ao mesmo tempo, que é essencial verificar em que medida essas decisões podem afetar a relação Executivo-Legislativo e a própria dinâmica interna de funcionamento do Congresso Nacional.


O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected]



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