Proposta prevê retenção de receita em farmácias; entidade diz que Novo Nordisk faz “lobby” para adiar aprovação da medida
O diretor-substituto da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Rômison Mota, adiou nesta 2ª feira (17.mar.2025) a decisão sobre mudanças nas regras de venda do Ozempic, do Wegovy e de medicamentos similares, popularizados para emagrecimento. A proposta determina a exigência da retenção da receita nas farmácias –medida já adotada para antibióticos– para reforçar o controle na comercialização desses produtos.
Segundo Mota, o adiamento se deu depois do recebimento de novas informações em reuniões com fabricantes. O Ozempic e o Wegovy são produzidos pela farmacêutica Novo Nordisk.
“Durante esse período de vistas do processo, mais notadamente nas últimas semanas, várias informações adicionais chegaram ao gabinete da 4ª diretoria, fruto de reuniões conduzidas com todos os atores que solicitaram encontros, inclusive diretamente com empresas detentoras de registro dos produtos junto à Anvisa”, declarou.
Embora a área técnica da Anvisa já tenha elaborado um estudo detalhado, Mota afirmou que é necessário um “aprofundamento técnico adicional” para avaliar a proposta regulatória.
ENTIDADE CITA “LOBBY DO OZEMPIC”
Como mostrou o Poder360, a SBEMO (Sociedade Brasileira de Medicina da Obesidade) moveu uma ação civil pública contra a Novo Nordisk, acusando a empresa de omissão e influência indevida sobre órgãos públicos, incluindo a Anvisa. Leia a íntegra do documento (PDF – 9 MB).
Segundo a entidade, o “lobby” da farmacêutica teria como objetivo adiar a aprovação da RDC (Resolução da Diretoria Colegiada) que implementa a exigência de retenção da receita. Foi essa a resolução que estava pautada nesta 2ª feira (17.mar), mas foi adiada pela Anvisa.
Procurada para se manifestar a respeito da ação movida pela SBEMO, a Novo Nordisk enviou uma nota em que diz que opera “em concordância às regras estabelecidas pelas autoridades responsáveis nos países” e que, no Brasil, segue os padrões estabelecidos pela Anvisa. Leia a íntegra (PDF – 119 kB).
RETENÇÃO DE RECEITA
A Anvisa já estuda implementar medidas mais rígidas para a venda desses medicamentos desde dezembro de 2024. Atualmente classificados como tarja vermelha —o que exige prescrição médica—, esses remédios podem estar sendo adquiridos de forma indiscriminada por causa da falta de mecanismos mais rigorosos, como a retenção obrigatória da receita, dizem especialistas.
Segundo a legislação brasileira, medicamentos com prescrição devem ser vendidos apenas mediante apresentação e análise da receita. No entanto, para a agência, existem indícios de que esses fármacos estão sendo comprados com pouca ou nenhuma exigência em farmácias físicas e aplicativos, em desacordo com a lei 5.991 de 1973 e a resolução 44 de 2009 da Anvisa.
“O projeto prevê um novo enquadramento para esses medicamentos, mantendo-os como tarja vermelha, já que eles não possuem características que justifiquem a classificação como tarja preta, por exemplo. A ideia é que continuem como tarja vermelha, mas com a obrigatoriedade de retenção da receita nas farmácias”, afirmou a advogada especialista em direito médico Thamires Cappello ao Poder360.
“BOOM” DO OZEMPIC
O Ozempic faz parte de uma classe de medicamentos originalmente desenvolvida para tratar diabetes tipo 2, mas amplamente usada de forma off-label (com finalidade diferente da bula) para a perda de peso.
No Brasil, os principais medicamentos dessa categoria aprovados pela Anvisa são semaglutida, liraglutida (princípio ativo do Saxenda) e tirzepatida.
A popularidade desses medicamentos deve-se à sua eficácia na perda de peso, poucas contraindicações e ausência de potencial de dependência, o que os especialistas consideram um fenômeno no combate à obesidade.