Itaipu gastou R$ 2 bi em convênios; compras levantam dúvidas

Itaipu gastou R$ 2 bi em convênios; compras levantam dúvidas


Estatal firmou mais de 120 convênios desde 2023; gastos com bolas e repasses a terceiros são questionados

Com repasses que somam R$ 2 bilhões, Itaipu firmou mais de 120 convênios socioambientais desde a posse do atual diretor-geral no Brasil da usina, Enio Verri (PT-PR), em março de 2023, até julho do ano passado, data da última divulgação pela empresa.

Entre os projetos, está a compra de milhares de bolas esportivas profissionais por valores considerados elevados, o que levanta questionamentos sobre a prestação de contas e os critérios adotados para os gastos. A expansão de despesas é bancada pela conta de luz dos moradores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Na página da Itaipu que lista as parcerias, o conteúdo detalhado não é divulgado, e faltam informações sobre o 2º semestre de 2024. O levantamento é da Folha de São Paulo.

Um dos convênios que chamam a atenção é o “Bio Favela – Cufa e Itaipu pela Vida na Favela”, firmado com o Instituto Athus, parceiro da Cufa (Central Única das Favelas) no Paraná. O projeto prevê um investimento de R$ 24,5 milhões entre agosto de 2024 e agosto de 2027, para atender 100 favelas.

No entanto, a prestação de contas referente à compra de bolas esportivas gerou questionamentos. Em outubro passado, o Athus adquiriu 2.100 bolas por R$ 300 cada, sendo 1.050 de basquete e 1.050 de futsal. Posteriormente, essa nota fiscal foi anulada, e uma nova versão indicou o valor de R$ 200 por bola, com o número subindo para 3.150 unidades.

As notas informavam que as bolas eram da marca Penalty, mas sem especificação do modelo. Fotos na prestação de contas mostravam modelos Playoff IX e RX, que custam pouco mais de R$ 100, enquanto a entidade afirmou que comprou modelos superiores, como a Crossover Tam 7 e a Max 1000 Termotec XXIV, que chegam a R$ 500 e R$ 300, respectivamente, e são destinados a atletas adultos de alta performance.Postagens em redes sociais indicavam que crianças receberam modelos mais baratos, o que reforçou os questionamentos.

Advogados especializados em projetos socioambientais apontaram que os modelos são de alta performance para atletas adultos.

A reportagem identificou ainda que a empresa fornecedora das bolas, Cocatto Sportes, tem registro como ME (microempresa) e deveria ter um faturamento anual de até R$ 380 mil. No entanto, a venda das bolas somou R$ 630 mil, o que ultrapassa esse limite. Especialistas consultados pela reportagem afirmaram que o fornecedor precisaria ter uma margem de lucro incomum para oferecer os descontos aplicados.

R$ 48 MILHÕES TERCEIRIZADOS

Outro convênio de grande porte é o “Programa de Capacitação AMP 4.0”, firmado com a AMP (Associação de Municípios do Paraná), com orçamento de R$ 48 milhões para capacitação de gestores em políticas públicas até dezembro de 2025.

O programa inclui treinamentos em diversas áreas, como autismo, alfabetização e licitações, mas a AMP não tem estrutura própria para a execução das capacitações, repassando a responsabilidade a uma entidade de ensino.

Segundo advogados consultados pela Folha de São Paulo, esse tipo de repasse pode levantar questionamentos, pois a transferência integral do objeto de um convênio é considerada irregular pelo TCU (Tribunal de Contas da União). No entanto, por ser uma estatal binacional, Itaipu não está sob a alçada da Corte, cabendo apenas ao Congresso fiscalizar os gastos.

Os recursos utilizados para financiar esses projetos provêm da tarifa de energia da usina, obrigatoriamente cobrada dos consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Em 2023, Itaipu no Brasil teve US$ 450 milhões (cerca de R$ 2,5 bilhões) para financiar convênios, em um movimento que o governo classifica como cumprimento da “missão socioambiental de Itaipu”.

OUTRO LADO

Em nota, Itaipu afirmou que monitora continuamente os convênios para garantir a correta aplicação dos recursos. Sobre a compra de bolas, a empresa declarou que a conveniada deve apresentar pelo menos 3 orçamentos e escolher a melhor relação entre custo e benefício. Segundo a usina, valores acima do mercado foram identificados e ajustes foram solicitados.

A Athus informou que a 1ª nota fiscal foi retificada após negociações para obter um desconto melhor em produtos de qualidade superior. A entidade também enviou fotos mostrando crianças utilizando bolas de maior valor, mas pediu que as imagens não fossem divulgadas para preservar a identidade dos menores.

A Cufa, por sua vez, esclareceu que sua participação no projeto se limita à mobilização dos jovens, sem envolvimento na administração dos recursos.

Sobre a parceria com a AMP, Itaipu explicou que a associação foi escolhida por sua capilaridade e conhecimento da realidade local. A AMP afirmou que o programa recebeu 35 mil inscrições e conta com 18.714 alunos ativos. No entanto, a entidade ainda não enviou um posicionamento formal sobre os questionamentos levantados.





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