Líderes europeus se reúnem emergencialmente em Paris para discutir o futuro do continente, às vésperas da delegação diplomática norte-americana se encontrar com a diplomacia russa
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A história nos oferece abundantes exemplos de armistícios selados das mais diversas maneiras. A maior parte deles, quando havia a capitulação completa de um dos beligerantes, envolvia não apenas um processo de rendição formal, mas a humilhação pública perante seu próprio povo em aceitar termos elaborados pelo seu inimigo.
No mundo pós-Segunda Guerra Mundial, o processo de paz ocorreu das mais diferentes formas em diferentes localidades, mas na maioria dos casos, a fuga do líder derrotado ao exílio, encaminhava o próximo governo de forma automática, eliminando facções fiéis ao mandatário anterior e removendo parte da estrutura de estado remanescente.
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Esse cenário doloroso para alguns e vitorioso para outros, parece ser o mais usual em um mundo de vitórias completas, mas em uma conjuntura de vitória parcial, a problemática se mostra muito mais complexa.
A Guerra da Ucrânia iniciada em 2014 e intensificada em 2022 com a invasão de grande escala pela Rússia, passou por diferentes momentos que desencadeariam diferentes desfechos. Inicialmente, os russos pensavam que se trataria de uma campanha militar rápida como foi na Geórgia, rendição do governo vigente, substituição de Zelensky por uma liderança russófila e reestabelecimento rápido da ordem mundial.
Isso não aconteceu. Em seguida, nos primeiros meses com ajuda robusta da OTAN e o senso de patriotismo elevado, os ucranianos pensaram que poderiam retomar todos os territórios invadidos. Isso também não aconteceu. A realidade se mostrou agridoce para qualquer plano de conquista ou reconquista total, sendo mais ácido para os ucranianos e mais doce para os russos. Após três anos de um conflito violento e centenas de milhares de mortos, o cenário favorável à Rússia é uma vitória simbólica importante, mas apenas uma vitória parcial.
Atualmente o exército de Vladmir Putin comanda cerca de 21% do território internacionalmente reconhecido como Ucrânia. Seus avanços consistentes nos oblasts de Kherson, Zaporizhia e Donetsk, somaram-se às conquistas já consolidadas em Luhansk e a península da Crimeia. Tratando-se de terras férteis em minérios e boas para o cultivo agrícola, Putin se vê como um grande ganhador deste conflito. Contudo, esse triunfo é relativo se observarmos que ao longo de três anos, a Rússia se tornou o país mais sancionado do mundo, perdeu milhares de seus tanques, aviões e blindados e sacrificou cerca de 200 mil homens de seu exército.
Hoje, porém, apenas os louros da vitória são divulgados, enquanto a comitiva russa segue à Arábia Saudita para se encontrar com Marco Rubio e outros diplomatas norte-americanos. A decisão de Donald Trump deixou claro que a nova administração em Washington DC busca romper todos os laços históricos com seu maior aliado, a Europa Ocidental, por questões ideológicas. O discurso do vice-presidente, JD Vence, em Munique enfatizou que a Rússia não deveria ser vista como uma inimiga da Europa, e sim os problemas internos europeus.
Talvez cinco séculos de imperialismo russo não sejam tão facilmente esquecidos pelos europeus, sobretudo os do Leste do continente, mas as lideranças europeias sabem que não podem mais contar com a compaixão histórica de Washington DC. Hoje, em Paris, Emmanuel Macron e todos os líderes mais importantes da Europa, se reuniram para discutir o futuro europeu sem a retaguarda dos principais aliados transatlânticos. As abordagens para solucionar a crise foram várias, muitos chefes de governo ecoando que não poderão aceitar “uma paz ditada” por Trump e Putin. Por mais que essa seja a posição moralmente correta, a Realpolitik feita por lideranças autoritárias e seus admiradores, redesenhará a Ucrânia ao bel prazer de Donald e de Vladmir.
Por isso, o consenso mais importante construído em Paris não foi o de como repudiar a quebra das leis internacionais, mas como prevenir de maneira eficaz, tais agressões de acontecerem novamente.
A resposta sugerida pela Polônia e aceita de maneira pragmática pelo restante é simples e objetiva, os gastos militares de todos os países europeus precisam aumentar consideravelmente e os exércitos precisam ser constantemente atualizados. A presença intimidadora do principal exército do mundo ao seu lado, acomodou os europeus por algumas décadas em sua posição secundária, hoje, isso não é mais uma opção. Mesmo sem os Estados Unidos, os países da Europa dentro da OTAN possuem um efetivo militar acima de 1.5 milhão de homens, duas potências nucleares com centenas de ogivas atômicas e algumas das tecnologias bélicas mais modernas de todo o planeta.
A defasagem em certos aspectos existe, mas pode ser facilmente corrigida redirecionando fundos mal gastos para uma área tão essencial para centenas de milhões de pessoas, como é a defesa. O futuro da Ucrânia parece que passará por negociações injustas de uma paz outorgada, já o destino do restante da Europa dependerá da visão dos líderes de hoje em proteger bem os seus amanhãs.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.