“Querem criar o PL Jair Bolsonaro”, diz autor da Lei da Ficha Limpa

“Querem criar o PL Jair Bolsonaro”, diz autor da Lei da Ficha Limpa


Márlon Reis, um dos idealizadores da legislação anti-corrupção, diz que propostas atendem “ambição de poder” do ex-presidente

O advogado e ex-juiz Márlon Reis, um dos autores da Lei da Ficha Limpa (135/2010), criticou a tramitação dos dois projetos de lei que buscam alterar as condições da inelegibilidade previstas na atual legislação. Os textos, apresentados por deputados do PL, partido de Jair Bolsonaro, podem beneficiar o ex-presidente caso sejam aprovados. 

Os deputados federais Bibo Nunes (PL-RS) e Helio Lopes (PL-RJ) querem mudar o tempo da inelegibilidade de 8 para 2 anos. Nunes propõe também que a proibição de candidatura ocorra apenas em caso de processo penal. Já Helio sugere que o veto só aconteça se houver condenação na última instância ou por órgão colegiado. As duas propostas poderiam permitir que Bolsonaro, declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até 2030, pudesse concorrer às próximas eleições presidenciais, em 2026.

Em entrevista ao Poder360, Reis disse que os projetos de lei têm “nome e sobrenome” de Jair Bolsonaro. Criticou a “ambição de poder” do ex-presidente e disse que a mobilização popular deve barrar o andamento dos projetos que buscam flexibilizar a legislação anti-corrupção.

O projeto de lei [PLP 141/23] é endereçado, ele tem um beneficiário individual, imediato, que é o ex-presidente Jair Bolsonaro, e a prova disso é que a Lei da Ficha Limpa contém dezenas de hipóteses de inelegibilidade e só está sendo pedida alteração do prazo na única delas que atingiu Bolsonaro, que foi o abuso de poder”, disse.

A Lei da Ficha Limpa entrou em vigor em 2010, alterando dispositivos da Lei de Inelegibilidades, de 1990. O texto endureceu os parâmetros que tornam pessoas inaptas para concorrer e ocupar cargos públicos.

Segundo o texto em vigor, os condenados por determinados crimes em decisão transitada em julgado (quando não há mais possibilidade de recurso) ou proferida por órgão judicial colegiado não podem concorrer às eleições. Também não podem concorrer os condenados à suspensão de direitos políticos em decisão final ou por órgão judicial colegiado em casos de ato doloso (quando há intenção de cometer uma irregularidade) de improbidade administrativa. 

A legislação nasceu como uma iniciativa popular que angariou cerca de 1,6 milhão de assinaturas. O projeto foi coordenado pelo MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral), uma organização sem fins lucrativos composta por 70 entidades nacionais. 

Marlon Reis é um dos integrantes do MCCE e idealizador do projeto anti-corrupção. 

A sociedade se mobilizou aos milhões para fazer com que houvesse uma inelegibilidade de 8 anos para essa hipótese. Não faz sentido que agora, para benefício de uma pessoa condenada pelo TSE, em 2 processos, se mude a lei para beneficiar essa pessoa e, por arrastamento, levar todos os condenados por abuso de poder nas eleições no Brasil”, afirmou.

8 ANOS EQUIVALEM A 3 ELEIÇÕES

Antes da Lei da Ficha Limpa em 2010, a legislação previa o prazo de 3 anos para a inelegibilidade– prazo que, segundo Márlon Reis, era “ridículo”.

O que significa [os 8 anos de inelegibilidade]? Apenas 3 eleições, porque na 4ª eleição a elegibilidade já está conquistada. Então, antes, o que nós tínhamos? Nós tínhamos um prazo de 3 anos que permitia que a pessoa que praticou um abuso de poder numa eleição para prefeito já participasse da próxima eleição para prefeito, porque o mandato é de quatro anos. Era ridículo”, disse em entrevista.

No seu projeto de lei, o deputado federal Bibo Nunes reduz a condição de inelegibilidade em ¼ do que é atualmente. Para ele, “a inelegibilidade por 2 (dois) anos seguintes ao pleito eleitoral é uma sanção mais do que suficiente para os fins que se almeja a inelegibilidade” e que a alteração de 3 para 8 anos é “severa e longa”. 

Para Reis, a estratégia do deputado bolsonarista busca derrubar a inelegibilidade no Brasil de maneira “pouco corajosa”.

Ele deveria ter mais honestidade de pedir a revogação da lei, porque com 2 anos não tem inelegibilidade. Dois anos depois já tem a eleição municipal e a pessoa pode participar, porque conta da data da eleição. É uma maneira pouco corajosa de defender o ‘liberou geral’ na política brasileira”, afirmou.

BOLSONARO QUER REVOGAÇÃO DA LEI DA FICHA LIMPA

Depois dos projetos serem noticiados, Bolsonaro publicou um vídeo em que defende a revogação da Lei da Ficha Limpa. Diz que a legislação anti-corrupção serve “para que se persiga políticos de direita”. 

Como justificativa, disse que caberia ao eleitor decidir em quem votar e não à Justiça Eleitoral. Afirmou que, no passado, a lei beneficiou a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que disputou as eleições de 2022 depois do STF (Supremo Tribunal Federal) anular suas condenações.

Assista (3m16seg):

Para Reis, a Lei da Ficha Limpa é uma das grandes vitórias  da participação popular na redação de leis do Brasil. Em detrimento dos projetos apresentados pelo PL, o Comitê Nacional do MCCE irá se reunir em Brasília na próxima quarta-feira (12.fev.2025). 

O trabalho da sociedade hoje é manter essa conquista, é uma conquista popular, não é uma conquista minha, não é uma conquista de algum deputado, é uma conquista da sociedade brasileira. É a opinião pública brasileira que blinda a Lei da Ficha Limpa”, declarou.

É o Projeto de Lei Jair Bolsonaro e ele vai ter que levar isso para o resto da vida dele, para debater sobre como é que se destrói uma conquista popular para satisfazer a ambição pessoal de poder dele.





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