Desde o início do mandato, Donald Trump, presidente dos EUA, assinou uma série de medidas que tiram direitos de pessoas trans no país
Desde que assumiu a presidência dos Estados Unidos (EUA), o presidente Donald Trump adotou uma série de medidas direcionadas especificamente contra os direitos das pessoas transgênero – que se identificam com um gênero diferente aquele que receberam no nascimento – no país; e que fere o direito destas pessoas ao redor do mundo inteiro.
Especialistas e lideranças do movimento trans ouvidas pelo Portal LeoDias descrevem quais as repercussões deste“Efeito Trump”, e explicam até quando e de que modo ele pode repercutir no Brasil e em outros países do globo.
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No final de janeiro, a influenciadora Zaya Perysian, uma mulher trans moradora dos Estados Unidos (EUA), relatou que mesmo depois de transicionar de gênero e ter todos os documentos retificados para o gênero feminino, recebeu um passaporte em que constava o gênero masculino. A mudança inesperada ocorreu devido a um decreto assinado por Trump em 20 de janeiro, que declara que o país reconhece “apenas dois gêneros, masculino e feminino“.
O novo passaporte de Zaya, solicitado em 23 de janeiro, ignorou outros documentos já retificados pela influenciadora, como certidão de nascimento, pois ela já emitido um passaporte anteriormente, antes da transição de gênero. “O sexo foi ‘corrigido’ na sua solicitação de passaporte para corresponder aos nossos registros”, informou o Departamento de Estado dos EUA através de uma carta enviada à Zaya.
Além disso, canais do governo dos EUA, como o próprio site do Departamento de Estado, deixaram de usar a sigla “LGBT” e passaram a usar “LGB”, excluindo assim a letra T, referente a população transgênero. “É como se o governos dos Estados Unidos dissesse que pessoas trans, cerca de 2 milhões, não existissem e que não merecessem nenhum recurso [do estado]”, protestou Zaya nas redes sociais.
“Efeito Trump”
Essa é apenas uma das medidas de Trump que, desde o início do ano, têm como alvo a população transgênero no país, que perderam acesso a programas e políticas federais de diversidade e apoio contra a discriminação; a possibilidade de servir dentro das Forças Armadas e o direito de ter o gênero no qual se identificam em documentos oficias.
Mais recentemente, na quinta-feira (6/2), Trump assinou um decreto que bane mulheres trans de participarem de atividades e competições esportivas em categorias femininas. A ordem inclusive determina que o Departamento de Educação deverá investigar escolas que não sigam a determinação.
As decisões de Donald Trump são direcionadas apenas à população dos Estados Unidos, mas repercutem globalmente em vários aspectos. Ainda assim, é incerto o quanto dessa influência pode afetar a tomada de decisões em solo brasileiro, como explica a deputada-federal Érika Hilton, uma das maiores lideranças da causa trans no Brasil.
”O Efeito Trump tem um impacto global; e nós estamos observando de maneira muito atenta como aqueles que odeiam as minorias sociais no Brasil e no mundo vão se comportar para tentar usar o legislativo ao seu favor”, disse Hilton ao Portal LeoDias.
“Me parece que a Câmara [dos Deputados] não irá se alinhar a essa precarização a vida e a esses ataques aos direitos. Mas do ponto de vista da mídia, isso é um perigo muito grande. Porque haverá uma grande mobilização para tentar fazer com que esse movimento seja importado para o Brasil para inflamar esse discurso de ódio [contra pessoas trans] na sociedade”, completou.
E esse alerta não serve apenas para o Brasil, mas para todos os países ao redor do globo, em especial os países do chamado “Sul Global” – como países da América Latina e África.
Segundo os pesquisadores da temática de gênero do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) ouvidos pela reportagem, isso ocorre porque a população trans desses países dependem muitas vezes de acesso à iniciativas internacionais para acesso a políticas afirmativas.
“Muitas ONGs e agências humanitárias internacionais dependiam de recursos dos Estado Unidos (EUA) para operarem. Então quando o Trump assume, ele retira esse dinheiro voltado para politicas de diversidades e deixa pessoas que dependiam dessa ajuda internacional sem ter para onde ir, porque elas já não podiam contar com recursos dos seus próprios países”, afirmam.
Os especialistas ainda mostram preocupação com a forma em que o discurso de Trump pode impactar no discurso e crimes de ódio contra pessoas trans ao redor do mundo. No Brasil, por exemplo, o país que mais mata pessoas trans no mundo, foram 122 vítimas apenas em 2024.
“Esse movimento do Trump é um contra-ataque a políticas nacionais e internacionais que garantiram direitos as pessoas trans e que as reconheceu como seres humanos. Então a partir da voz dele, que ecoa ao redor do mundo, se reforça uma ideia de que pessoas são menos humanas que outros, que justifica que essas vidas são menos importantes e são mais ‘matáveis’ que outras”, completam.
As declarações de Trump, no entanto, não fragilizaram a professora universitária Sara Wagner York, 49. A brasileira e mulher trans que mora em Pittsburgh desde 2024 afirma que é questão de tempo até que a população dos EUA veja através “das mentiras e do medo” promovido por Trump.
“[Donald Trump] usa essa estratégia de transformar as pessoas trans em um inimigo público do povo dos Estados Unidos como uma cortina de fumaça. Ele usa esse discurso de ódio contra a população trans, que é minoritária e vulnerável, para esconder as verdadeiras ações que seu governo está fazendo, e para onde está indo o dinheiro do povo americano”, argumentou.
“Porque eles [pessoas alinhadas a política de Trump] querem justamente colocar medo em pessoas como eu e nos manter nesses devaneios de perigo e de pânico que eles se esforçam para criar. Então o segredo para sobreviver a estes tempos difíceis é ter foco no que você é e naquilo que você quer”, finaliza Sara.