Fernando Haddad perdeu mais uma para a política. Uma mistura de erro de comunicação, fake news e, sobretudo, medo de perder popularidade, levaram o governo a revogar a portaria da Receita Federal que apertava o monitoramento das transações por pix. Depois que a medida mal explicada se espalhou pelas redes cercada, o governo se viu emparedado pela oposição, que o acusava de querer taxar os ganhos de pedreiros, marceneiros, cabeleireiras e outros trabalhadores que dependem da ferramenta. Não só voltou atrás como editou uma medida provisória para garantir que o pix não pode ser taxado.
Sidônio Palmeira, o novo ministro da Secom, tentou remediar. Colocou Lula na TV fazendo um pix para o Corinthians para provar que não haveria tributação. Ministros foram às redes desmentir as fake news, e o Banco Central assinou um vídeo que desceu à linguagem nada institucional das redes — “BC na área full pistola, porque vocês decidiram descer para BC no comecinho do ano com essa lorota de que o Pix vai ser cobrado. Nada muda nas regras do Pix, bebê.”
Os memes não adiantaram. A estratégia da oposição levou a melhor e mostrou a falta de rumo do governo. Afinal, não se sabe mais se a medida era ou não necessária. Ninguém conseguiu explicar. Teve enorme apelo o vídeo protagonizado pelo deputado mineiro Nikolas Ferreira. Ele admitiu que o pix não seria taxado, mas questionou a credibilidade do governo e deixou a dúvida no ar sobre uma medida futura. Trabalhadores informais foram fisgados pelo discurso, e Nikolas ganhou milhões de likes. O governo jogou a toalha e escalou a AGU para tomar providências contra os propagadores das notícias falsas.
O ministro da Fazenda enviou ao Congresso em dezembro um conjunto de medidas fiscais aquém daquilo que os agentes financeiros consideram necessário para equilibrar as contas públicas. O Congresso aprovou, mas não houve propostas de corte efetivo de gastos obrigatórios. A timidez do pacote foi atribuída às pressões político-eleitorais. O dólar passou de R$ 6, e Haddad administra hoje uma crise de confiança junto a investidores, que duvidam da capacidade do governo de honrar seus compromissos num futuro não muito distante.
A trapalhada do pix leva essa crise à parcela da sociedade que vive sob a pressão da inflação – especialmente dos alimentos. É o estrato em que Lula tem sua maior aprovação, segundo o Datafolha: 44% dos eleitores com renda de até dois salários mínimos acham seu governo ótimo ou bom.
O pix, em apenas quatro anos, representou uma revolução para essa camada da sociedade, ao democratizar o acesso aos serviços financeiros. É usado por quase 80% da população. Erros de gestão governamental costumam ser chamados de falhas de comunicação. Marqueteiros podem ajudar a consertar estragos, mas recuperar a confiança do eleitor exige muito mais do que fabricação de memes. Depende da capacidade do governo de realizar boas políticas.
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