Uma da vitória emblemática da seleção nacional e que representou um prenúncio do confronto que se repetiria na Copa de 1970, no México, foi contra a Inglaterra, no Maracanã, em 12 de junho de 1969. O amistoso marcou a despedida dos gramados do goleiro bicampeão Gylmar dos Santos Neves. Naquele dia, o arqueiro completava 100 partidas com a camisa amarela. Em campo estavam as equipes vencedoras dos três mundiais anteriores: o Brasil, em 1958 e 1962, e os ingleses, em 1966. Foi um duelo de gigantes! O técnico João Saldanha colocou em campo Gylmar, Carlos Alberto Torres, Djalma Dias, Joel Camargo e Rildo; Clodoaldo e Gérson; Jairzinho, Tostão, Pelé e Edu (Paulo Cézar Caju). A Inglaterra contava com grandes estrelas, como Bobby Moore, Bobby Charlton, Geoff Hurst e o goleiro Gordon Banks, que defendeu um pênalti cobrado por Carlos Alberto Torres.
Bell abriu o placar, no Maracanã, mas, na garra, Jairzinho e Tostão viraram o marcador e o jogo terminou com o placar de 2 a 1. Depois da vitória, o cronista Nelson Rodrigues não perdeu a chance de tripudiar os críticos da seleção e destacou que Tostão marcou um gol praticamente deitado no gramado: “E a maioria dos locutores, principalmente os paulistas, continuava a exigir a retirada de Tostão. E, no momento em que mais se exasperavam contra o maravilhoso jogador, Tostão é derrubado, deita-se na grama e faz o gol! Foi um assombro. Em pé, Tostão já é pequeno, pequeno e cabeçudo como um anão de Velásquez. Imaginem agora deitado. Os ingleses ficaram indignados e explico: — um gol como o de Tostão desafia toda uma complexa e astuta experiência imperial. Um minuto depois, ou dois minutos depois, Tostão dá três ou quatro cortes luminosíssimos e entrega a Jairzinho. Este põe lá dentro. Naquele momento ruía toda a pose inglesa. Era a vitória e pergunto: — como reagimos diante da vitória? Claro que o homem da arquibancada subiu pelas paredes como uma lagartixa profissional. Mas pergunto: — e os outros? E os outros? A imprensa, o que fez a imprensa? E o rádio? E a TV? Deviam estar virando cambalhotas elásticas, acrobáticas. A Inglaterra pode não ter futebol, mas tem o título. É campeã do mundo. Portanto, vencemos o título. (…) A Inglaterra foi um Bonsucesso. Dirão que estou fazendo um exagero caricatural. Mas, se o Bonsucesso tivesse assassinado a pauladas Maria Stuart, se jogasse à sombra de lord Nelson, lady Hamilton e Dunquerque, e se morasse no palácio de Buckingham — o Bonsucesso faria mais que os ingleses. Batidos em dois minutos, submetidos a um ‘olé’ inédito e ignominioso, faltou aos nossos adversários a nobilíssima humildade da autocrítica (…)”. No texto, Nelson Rodrigues faz referência ao time do Bonsucesso, do Rio de Janeiro.
Depois daquele amistoso, Brasil e Inglaterra se enfrentaram na primeira fase da Copa de 1970, no México, em um dos duelos mais marcantes dos mundiais. João Saldanha não era mais o técnico, tinha sido substituído por Zagallo. Foi o confronto entre o futebol arte e o futebol força. Voltando a 1969, ouça a íntegra da partida com a narração de Jorge Curi, da Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Imperdível.